Depois de um longo tempo de treinos, Iliana Brown disse ter
notado que os Dragões estavam prontos para um novo com bate. Isso com suas
doses de sarcasmo e ironia, sempre presentes.
Lacktum aprendeu novas magias junto à bruxa. Arctus e Gustavo
pareciam mais concentrados, meditando sobre forças antigas. Combater o inimigo
é compreendê-lo, sem se tornar ele. E era um método bom de enfrentar os
adversários. Thror parecia ter se adequado ao combate com duas armas. Na verdade,
ele guardou até mesmo sua arma mágica começou a usar espada longa e curta
comuns. O que não é normal vindo dele. Talvez fosse um modo de expiar seus
crimes, isso é enquanto teria sido Fobos. Seton se manteve recluso diferente de
todos os outros. Não parecia o mesmo de sempre. Isso preocupou os outros.
O druida um dia ficou afastado da casa, só que Brown o
seguiu. Quando o encontrou, começou a gritar:
-Então é assim que foge do meu treino? Fica aqui nessa
clareira e sem nada para fazer?
Seton estava sentado em um toco de árvore naquela clareira,
olhando para o céu cinzento de Eire. A ilha não era de todo horrível, mas
cansava as pessoas, pois tinham que enfrentar algumas criaturas bizarras,
típicas da cultura celta. Não parecia ser a atual preocupação do druida.
-Vamos, faça o seu melhor – foi o que ele respondeu a sua
mestra e torturadora.
Ela se sentou ao lado do sacerdote da natureza. Não gostava
quando eles deixavam o medo de lado.
-Qual é o problema? Normalmente, vocês fogem de mim como um
demônio de um homem santo de verdade. O que houve?
Ele se levanta, colocando as mãos dentro de suas próprias
vestes. Olhou mais uma vez para o céu. Raios de sol cruzavam o dia nublado
naquelas terras. Bufou sem grande motivação.
-Odeio não ter forças. Eu não sei o motivo daqueles idiotas
parecerem tão fortes. Querem poder e logo vão obter isso. Parece isso claro
agora para mim. Eu... Não consigo... Eu acho.
-Não consegue? Então não tente! Simples assim.
O druida olhou com ódio para a maga. Queria esganá-la com uma
corda. Era como falar para uma porta.
-Olha, se esta triste com o que obteve até então, desista de
tudo se reinvente. Reescreva. Ouvi falar da sua audácia em algumas ocasiões, já
em outras soube que parece com um esquilo covarde. Foi o que me contaram alguns
dos Dragões. Mas você já falou a resposta para isso... Motivo!
-Motivo?
-Por acaso é surdo? Motivo é que nos guia, nos sustenta.
Lacktum quer agora saber os segredos do seu pai. Antes era por vingança. Já
Arctus quer poder, mas pelo jeito correto creio eu. É o que alguns pensariam... Poder por poder
simplesmente é tolice. Ele encontrará essa resposta um dia. Acho que o mais
idiota é o paladino que quer salvar o mundo, até mesmo os inimigos. Isso ainda
o fará morrer...
-Pensei que só Douglas fosse capaz de tal feito... Só ele
seria capaz disso... Devido a maldição.
-Nunca acreditei em maldições. Ou em divindades com formas
humanas como punição. Aqueles dois têm que falar de tudo para todos...
-Bem, mas sabemos que podemos acreditar neles não é? Afinal, foram
mesmo para o Além! Ao menos é o que dizem.
Iliana olhava para Seton com fúria agora.
Saber de coisas, não nos faz acreditar nelas. Deuses possuem
um grande poder. São como humanos assim mesmo. Ou seja, podem ser derrotados.
Na verdade, podem até ser mortos. Como quaisquer outros seres. E precisam
enfrentar os mesmo problemas, encontrar os motivos para continuar vivendo. E
assim que um homem conquista o que quer. Seja lá o que se quer.
-E como ser o que eu quero?
Ela então bufou.
-Você não sabe. Você só sente. Bem, vamos embora, pois amanhã
todos saem da minha vida. Ainda bem!
A maga então começou a caminhar. Seton olhou para o céu, como
as nuvens já cobrindo um fraco sol.
Seton formulou uma pergunta:
-É possível... Matar um deus
No dia seguinte, os Dragões da Justiça já estavam prontos.
Ainda bem, alguns pensavam.
O tempo em que estiveram em Eire não foi tão bom quando
Avalon. Treinos terríveis e maus tratos. Coisas de Iliana, só que eles agora
estavam mais concentrados agora. Pareciam prontos para o futuro inerentes
deles. No final, a bruxa não era tão maligna quando nos contos infantis
germânicos. Ou os da ilha em que estavam.
Cada um se despediu da Brown a seu modo. Lacktum foi o
último. Como de costume.
-Bem, acho que isso é uma despedida.
-E você acha que estou triste?
Ele riu da resposta.
-Você nunca conseguiu mentir para mim.
A bruxa olhou de maneira estranha para o mago. Ainda estavam
de frente a cabana ainda.
-Se realmente fosse uma pessoa tão odiosa quanto tenta deixar
parecer, não nos auxiliaria em nada. Na verdade, você para mim é tão doce como
o mel minha querida mestra.
Iliana se aproximou do rosto do mago, o esmagando com a mão
esquerda.
-Isso não significa nada. Eu poderia estar sendo forçada a
isso. Não pensou nisso não é?
Lacktum olhou com sarcasmo para sua mestra naquele curto
período, quando ela o largou. Os outros pensavam que ele parecia com uma
criança bem nova que brinca com os dentes de um lobo. Com presas bem afiadas.
-Fale o que quiser bruxa... Até mais...
-Espere – pronunciou Iliana em tom de cautela – Saindo daqui
partiram em direção a um navio. Lá, existem pessoas que conhecem. Mas eles não
os reconhecerão. Pois através do Paradoxo, o fenômeno do tempo perdido ocorre.
-Como assim? Explique isso.
Ela estava como olhar severo, mas até terno.
-As magia antigas e poderosas devem ser contidas por uma
força mantenedora, conhecida como Paradoxo. Isso qualquer mago, com certa
experiência sabe disso. O que poucos notam, ou o fazem tarde demais, é que o
Paradoxo acaba com certas lembranças das pessoas que os arcanos conhecem para
evitar que as magias de grande porte se propaguem. Até o ponto de se perderem
no tempo e no espaço de suas mentes, até que Gaya rejeite estes seres. Pior
ainda para vocês que nada mais, nada menos são os legados dos Imortais Esquecidos. Esse é o tempo
perdido que me referi anteriormente, já que o tempo será reescrito nas memórias
dos seres humanos que os conheceram.
-Espere, se o que diz é verdade pelo menos por enquanto, não
iremos nos preocupar. Já que só os fracos não vão se lembrar de nossa
existência, certo?
-Sua filha não tinha poder suficiente para impedir o efeito –
falou Arctus, atento a toda aquela conversa – E quando se afastou dela por um
longo tempo, o que você chama de tempo perdido a afetou, irreversivelmente.
-Exato padre! Ele possui um cérebro apesar da batina.
-Só não explica uma coisa: como Sinestro conseguiu manter-se
na memória de sua filha e posteriormente na de sua neta.
-Primeiro não a chame de minha neta. Chame de filha de minha
filha, padre idiota. Segundo é só pensar um pouco. Sinestro pode ter implantado
memórias através de sonhos. Com certeza, boa parte delas é falsa, ou mostrou
algo que ela gostasse. Porém, verdadeiras o suficiente para enganar qualquer
um. Ele sempre foi poderoso com forças da mente. Além disso, a condição dele
hoje em dia é quase de um morto faminto, o que significa nunca ser afetado pelo
Paradoxo diretamente. Normalmente, monstros assim são transformados em monstros
de lendas aos quais poucos acreditam. Tentando desmotivar os mais crédulos.
Compreende?
-Sim, sim... – e antes que o padre ou o mago falassem alguma
coisa, os expulsou gritando:
-Saiam logo daqui, bando de lagartixas! Ou seres de sangue
frio de qualquer tipo! Vão logo!
Começaram a caminhar em direção ao litoral. Alguns pensavam e
falavam como era boa a viagem para se livrar da tirana mestra. Só Lacktum olhou
para trás e notou algo estranho nos olhos de Brown. Parecia que ela havia uma
mágica de ilusão nos olhos. Então se lembrou de algo
Condeno a nunca mais ver tua filha
E então Lacktum se deu conta que Iliana era cega.
Caminharam dois dias até chegar finalmente ao litoral. Por
morros e montanhas, todos cheios de problemas e criaturas bizarras, além da
vegetação que parecia ser formada principalmente de espinhos. A ilha em si,
naquele caminho, parecia estar cheia de lugares de difícil acesso.
Talvez fosse por isso que o povo de lá era tão bruto e tão
forte. Trazia consigo o sofrido suor que não os fazia deixar de acreditar em um
futuro. Uma força que também era possível notar em Iliana. Eram por motivos
diferentes, mas seus espíritos tinham a mesma garra como itens diferentes.
Queriam cumprir seu dever. E para eles era vencer acima de tudo.
Depois de um bom tempo, quando o sol clareava com certa força
no céu, os Dragões finalmente chegaram à praia onde conseguiam ver barcos.
Neles havia homens com roupas típicas de piratas, porém não pareciam
ameaçadores. Na verdade, tinha algo neles que traziam lembranças boas.
-Lacktum – dizia Thror que carregava boa parte da bagagem –
Eles não parecem com os homens de...
-Sim, eu notei. Homens de Joseph Boas Línguas – respondeu
ele.
-Quem? – perguntou Arctus confuso
-Joseph e seu imediato Yuri. São piratas que já nos
auxiliaram.
-Nunca vi isso antes. Piratas gentis! – falou um Gustavo
levando boa parte das armas do grupo.
-Você falando dessa maneira... Mas garanto que ele é um bom
homem. Pelo preço certo...
O litoral deveria ser o lugar mais lindo de toda ilha de
Eire. Cheio de pedras, o que dificultava a aproximação de um grande navio, mas
que ainda transformava local em um pequenino paraíso. O vento frio cortava o
rosto de todos aqueles homens com uma força profana. Só que isso não os
desanimava. Na verdade, só os estimulava mais ainda a um futuro combate. Depois
do que enfrentaram, deuses ou demônios seriam nada demais para eles.
Eles chegaram próximos dos homens do mar. Sujos, cheios de
roupas diferentes. Alguns pareciam vir do outro lado do Mediterrâneo, outros do
extremo norte gélido e até mesmo alguns que vieram das terras onde pessoas têm
olhos de raposa – como o tal de Yue Khan. Todos diferentes, mas animados como
crianças amigas.
E então, do meio daqueles piratas surgiu um caminho para o
grupo. Ao centro um homem com roupas que pouco contrastava com os demais.
Camisa aberta, pelos do peito a mostra e uma barba tão suja quanto o cabelo.
Alguns do grupo não entendiam por qual motivo havia surgido aquele ser entre
eles. Entre os Dragões da Justiça mais antigos surgiu uma grande felicidade e
apreensão naqueles jovens heróis. Joseph Boas Línguas, o pirata misterioso
estava na frente deles.
Quando Thror iria abraçar o antigo colega, foi impedido por
Yuri, o mago a serviço de Joseph. Um ato estranho para alguns dos membros do
grupo.
-Oh, oh! Calma lá comida dos peixes de água doce. Qual o
motivo de tanta intimidade com o nosso capitão?
Thror se afastou da mão detentora do imediato. Ele poderia a
quebrar com a um simples golpe. Preferiu não o fazer. Nenhum deles esboçou uma
reação até então. Nem os heróis, nem os piratas
-Yuri, não se lembra de nós? Lacktum, Thror. Têm alguns
rostos novos, outros desapareceram, mas...
Joseph interrompeu com uma mão no queixo e a outra em um
sabre.
-Vocês são quem Iliana havia pedido que levassem até o norte?
Como devem ter treinado com aquela bruxa enlouqueceram. Por isso compreendo
suas atitudes. Nenhum de nós os conhece.
Quando os combatentes iriam proferir algo, foi a vez do
arcano ruivo de comentar em tom baixo aos Dragões:
-Agora faz sentido o que Iliana dizia. Eles não vão se lembra
de nós. Deve ser um dos efeitos do Paradoxo. Mesmo homens tão fortes se esquecem
de nós. Não podemos nos esquecer do que ela nos disse. Pode ser uma elfa bruxa
louca, mas sua sabedoria é poderosa e perigosa...
Depois de muito conversarem – e arrumarem a bagunça inicial –
Lacktum convenceu os colegas a agirem do modo mais convencional. Eles eram
agora apresentados aos tripulantes do Salva Ventos como completos
desconhecidos.
Após as apresentações devidas, todos subiram nos barcos, em
direção ao navio de Joseph. Todos sentiam a nostalgia da época em que começaram
essa odisséia. Uma nova jornada começava, mas muito se perdeu. Pessoas partiram
como Hugo, Richard e Gor, ou quebraram os laços como Halphy. O pior ainda foi
perder alguém...
Todos sentiram aquela vida se esvaindo de algum modo. O
paladino. O terrível fim que aconteceu com ele. Só que aquele navio trazia
imagens do amigo que nunca mais voltaria. Memórias, fragmentos de alguns meses,
mas que causavam uma dor boa. Já se sentiu assim? Quando um ferimento concedia
as memórias de alguém querido? E lhe concede tantas coisas boas? A dor para de
qualquer modo. Sempre acaba. E você não tem certeza que quer ela de volta ou
não.
Os marinheiros – que na verdade eram piratas – não se
preocupavam com esse tipo de coisa. Um porto, uma nova história, uma nova vida.
Nada com que se preocupar ninguém para manter laços. Só o doce mar. Era tão
lindo o mar, que até mesmo morrer deveria ser bom. Nas ondas azuis do mar...
Thror se ofereceu como ajudante, os outros preparavam e
afiavam suas armas e magias. Todos com exceção de Lacktum... Sim, ele não
passou bem... De novo...
Novamente, Thror cantava a mesma canção de tesmpos atrás. Só
que nesse momento nenhum dos piratas se lembrava dela. Como se a escutassem
pela primeira vez na vida. Para quem se lembrava da viagem até a Grécia era
triste de se ver.
O imediato Yuri foi até o jovem que vomitava na proa do
navio. O arcano parecia estar melhorando. Ou seja, estava bem menos verde e
roxa, a pele do seu rosto. O pirata batia nas costa do mago.
-Rapaz, parece abatido.
Após uma nova disparada de líquidos – já que tinha expelido
todo o sólido antes – ele responde.
-É lógico! Acha que estou bem soltando tudo isso pela boca?
Ai, ai...
Yuri ri.
-Não falo disso. Refiro-me ao seu rosto antes do começo da
viagem. Carregava todo o peso do mundo em sua alma. Só por ser um homem do mar,
não significa que não compreendo as mazelas da terra.
-Você é um pirata! Um homem que pensa através do sangue em
sua lâmina.
O imediato ficou de costas para o mar com ares de
ressentimento.
-Só por ser um pirata não significa que me delicio tirando o
sangue de homens. Faço isso, pois sempre foi assim na minha vida. Desde que me
lembro estar nesse mundo como um órfão.
-Perdão...
-Não peça desculpas. O que diz sem pensar, também provém só
de sua boca. E o que falamos aos ouvidos de alguém nunca retornará a nossa
mente. Pois já estão lá, presas com correntes, cada palavra, cada sentimento...
-O que diz faz muito sentido... Se me permite, como entrou
para essa vida criminosa?
-Primeiro não acredito que cometo atos criminosos só me
aproprio de bens alheios por tempo altamente indeterminado – quando falou isso,
o imediato arcano riu – Segundo, como todo o órfão de pais e afeto. Vivi muito
tempo no reino da França como um ladrão de rua, usurpando o que era necessário
para viver. Até lógico ser capturado. E quando isso ocorreu, foi rápido para
mim. O que nunca imaginei é que seria adotado por um mago ao qual tentei
roubar. Era um mago sarraceno até que poderoso. Ensinou-me o básico de magias
para utilizar no mar. Queria que eu viajasse, conhecesse o mundo, me tornasse
alguém melhor para proteger as pessoas. Como um mago que iria ajudar os outros
de tempos em tempos, acumulando conhecimento místico no processo. Só que nem
tudo é como queremos. Quando comecei as viagens, entrei em vários navios de tamanho
e missões de diferentes. Sendo que quando conheci Joseph foi engraçado... Ele
estava no litoral gritando para mim. Dizia bobagens. Falando que iria se tornar
um rei dos mares. Achei que ele era extremamente ridículo. Gritando em
encontrar o maior tesouro conhecido pelo homem. Sorriso tão estúpido... Só que
acreditei nele. Passamos por muitas provações. E estamos unidos até hoje, como
irmãos de sangue. Compreende, assim como vocês e seus aliados.
-Meus amigos, você quis dizer.
-Isso. E então? Satisfiz sua curiosidade?
-Um pouco – retirando um pequeno livro de seu manto, ele
sorriu – Sempre é bom conhecer algumas histórias. Especialmente boas histórias.
Agora me lembrei que tenho algo para ler...
Yuri olhou com certo interesse para o livro
-É o seu grimório rapaz?
-Não. É um livro que recebi de um antigo arcano. Um amigo. E
peguei recentemente de volta por meios não muito ortodoxos. Acho que ninguém
reparou.
-E ele trata do que, pequeno e inexperiente ladino?
-Nunca fui de furtar. Essa era a função de outra pessoa – e
continuou dizendo o ruivo – Só foi retomado o que já era meu. Bem, não sei ao
certo qual o seu conteúdo, mas quero decifrar seus segredos.
-Se quiser que o auxilie...
Por instantes o mal estar causado pelo mar cessou do rosto de
Lacktum. Sua face estava paralisada em raiva contra o imediato. Como se o mago
do navio quisesse lhe tomar até as folhas do livro se necessário. Página por
página! O conhecimento era seu por um único e verdadeiro motivo. E a ninguém
mais deveria ser entregue esse saber.
Lacktum começou a caminhar na direção da porta que concedia
acesso ao seu quarto. Com olhar estranho. E Yuri não compreendeu a última parte
da conversa com Van Kristen.
Ao chegar ao quarto, ele acreditava estar sozinho. Porém,
quando foi deitar, notou que não estava sozinho naquele aposento. Pegou sua
faca o mais rápido que pode e protegia o livro como conseguia. Quando notou, o
estranho invasor estava em suas costas. Sabia disso, pois simplesmente a tocou
com leveza.
-Não se preocupe Lacktum. Só estou aqui para prepará-lo. Uma
tormenta se aproxima de todo esse mundo.
-Quem é você? E como adentrou o navio sem que ninguém o
notasse.
Um homem com uma grande camisa branca. Lembrava até um homem
das terras sagradas, onde Jesus deveria ter nascido. Ele tinha pele morena, mas
olhos de um castanho claro e belo. Cabelos curtos e simples.
-Não tenho muito tempo para lhe contar isso... Mas deve tomar
cuidado. Pois Sinestro agora quer sua morte mais que tudo. E ele não será seu
maior adversário.
-Então quem seria? Qual outro tirano pensaria em causar tanto
mau a um mundo tão vasto e belo como Gaya?
-Muitas coisas ainda lhe são negadas Van Kristen. Mas
prepare-se para Maelstrom.
-Quem?
-Esse livro é importante, mas não deixe seu coração ficar
nublado com a raiva. Ela é má conselheira. E pior aliada.
-Fala coisas sem nexo... Porém não parece ameaçador.
-Pois elas farão. Afinal, estou lhe contando sobre o futuro.
Ao qual pode não ter mais você.
-Como assim? Quem é você? Por qual nome o chamo.
-Antes te partir... Concederei-lhe um nome. Peter. Fale que
sou Peter.
Com isso dito, Lacktum só piscou rapidamente. Em um instante
seguinte, era possível ver que não havia mais ninguém ali. Talvez fosse só
parte do lhe falaram antes. Que o livro lhe causava alucinações. Ou talvez não.
Quem saberia?
Thror e Seton auxiliavam os piratas no dia seguinte. Parecia
que uma tempestade estava para ocorrer. Precisavam manter o navio inteiro.
Entre outras coisas, manter as velas hasteadas e fazer com que a madeira da
embarcação não se partisse, quase sempre pelo peso que tinham.
Os homens de Joseph eram fortes e bravos. Heróicos, mesmo
sendo um bando de saqueadores impiedosos pelo que eles mesmos diziam. E isso
não tirava o seu valor como exploradores. Homens do mar são levados por seu desejo
de conhecer novas terras. E isso impressionava os mais contidos membros dos
Dragões da Justiça.
Só que no caso de Arctus e Gustavo preferiram ficar nas suas
cabines na maioria do tempo. Como seria de esperar sobre o guerreiro grego e o
druida da grande foice, eles queriam sentir a tempestade. Em especial era o
tolo e corajoso, que possuía uma cicatriz na cabeça.
Ele se lembrava em pequenas partes que em seu passado já
navegou pela Grécia. Como Fobos, buscando um novo desafio. Um maior que o
outro. Não por ter feito essa procura do mais forte. Mas por continuar com ela
em sua cabeça.
-A procura do mais forte...
-Saia desse mundinho mágico Tzorv! – gritou Seton enquanto
tentava hastear a vela. Parecia que o guerreiro estava cheio de pensamentos.
Coisa rara para ele alguns diriam.
-Ah sim! Sinto muito! Puxem! – e como se obedecesse as suas
próprias ordens puxou com força as cordas.
Depois de muita dificuldade conseguiram manter o navio
inteiro. Só que ao terminarem viram algo estranho no mastro. Parecia um monte
de panos subindo por ele. E foi quando Thror notou.
-É o Lacktum.
-Mas qual o motivo dele estar fazendo aquilo? – perguntou
Joseph.
-O livro! – respondeu Thror, demonstrando seus surtos de
genialidade.
-O que? – estranhou o pirata com aquela resposta.
Ignorando o capitão do navio, Tzorv fitou Seton.
-Lembra, pouco tempo depois de encontrarmos o anão Rufgar. O
Lacktum enlouqueceu, passando por nós. Queria matar o anão. Deve ser o mesmo
que aconteceu daquela vez.
-Praga!
De repente, do mastro era possível ouvir:
-Ah Poseidon! Cala essa imensa bocarra! Lembra de mim? Ao
qual meu jantar e almoço, joguei tantas vezes? Sim, o ruivo louco por vingança!
Grita. Grita de raiva rei dos mares!
Os marinheiros que observavam tudo aquilo no convés soltavam
diversas expressões como:
-Ele enlouqueceu!
-Tirem-no de lá – gritava outro.
-Isso é mau presságio! – falou um temeroso.
E Lacktum continuava seu texto sem sentido. Só então Thror
olhou com apreensão para Seton.
-Druida, me empreste sua foice!
-Para que? – perguntou ele assustado.
-Só me arranje ela por um momento!
O guerreiro tomou então uma boa distância do mastro do navio
– o quanto conseguia naquele espaço, melhor dizendo – enquanto erguia a foice o
máximo que podia. E aproveitando o balanço do navio, usou a arma como ponto de
apoio. Assim ele saltou, fixando a lâmina na madeira.
O vento contribuiu, fazendo o herói voar, literalmente. Ele
cruza parte da embarcação até a estrutura. O pedaço de madeira estava próximo
de Thror. Um erro e estaria com a vida em perigo. Parecia que o tempo parava,
enquanto o guerreiro atravessava o ar. Algo quase divino. As respirações
paravam, torcendo que o homem chegasse à segurança do outro lado. Uma força de
vontade que visava ajudar o seu amigo. Como ele o fez anteriormente no mundo de
Além. Sua única chance era segurar uma corda que o balançou até o mastro. Ele
alcançou onde estava o mago de cabelo ruivo.
Ele estava pendurado, fitando o horizonte. Como se buscasse
algo alegremente. De repente ficava triste. Parecia uma criança que levou uma
bronca de um pai. A tormenta não estava só no mar, mas também com o coração de
Lacktum. Os deuses dos mares pareciam chamar a alma perturbada do arcano. Assim
como já chamou a de poetas, marinheiros, peregrinos, toda a sorte de homens.
Heróis e louco. Almas nobres tragadas pelo mar. Thror sentia que se não tomasse
cuidado, o amigo se perderia também.
-Lacktum! O que pensa esta fazendo?
Ignorando o aliado, Lacktum se tornou um ser que soltava
palavras de tagarela desconexas:
-Oh pai, não se enfureça! Juro que não o desobedecerei, nunca
mais! E eu entrego-lhe as estrelas, o Sol e a Lua! Só me deixe com meu
presente, sim? Eu imploro!
-Lacktum! Olhe para mim!
-Que lindo céu que o pai fez para mim...
-Lirah! O que você acha que ela iria dizer sobre isso?
O mago ruivo ficou perplexo, atônito, mais ensandecido.
Afinal, era algo novo naquela situação. Como quando um trovão cruza o ar, quase
nos deixando ensurdecidos. Não que vez ou outra, não ocorresse isso. Mas tudo
eles pareciam tão inferiores ao nome da jovem.
Lacktum virou a cabeça quase como um animal se acalmando.
-Meu lugar ao céu? Aonde esta meu lugar ao céu? – falando
isso, o arcano se aproxima de Thror com um movimento ameaçador. E assim, a
calma de seu rosto sumiu.
O guerreiro não havia esquecido que entravam em uma batalha
contra o senhor dos mares. Homens sábios perdiam suas vidas por agir contra
aquelas águas. Assim com Odisseu, protegido por Atenas. Thror deu graças por
ser um dos maiores tolos que já conheceu.
Sua cabeça estava cheia de planejamentos. Como salvar um
amigo quase o estava matando? Sim, sendo o navio um brinquedo naquelas águas,
eles eram pequenas peças nesse momento.
O mar se agitava, as forças do mar e do céu se enfrentavam.
Pareciam que anjos e demônios deveriam lutar. Antes fosse. Na verdade, o céu
escuro sem trovões estava distante. As águas arrebatavam o navio como um
pequeno pedaço de madeira. Salva Ventos se mantinha firme, mas por quanto
tempo?
Thror mantinha-se firme, com uma mão no mastro e a outra
estendida para o líder dos Dragões. Ele tremia como nunca antes fez mesmo em
uma batalha. Seu coração temia que o amigo se perdesse tanto na loucura, quando
no mar. Não deixaria que ele o fizesse. Mesmo que para isso significasse sua
vida.
-Isso! A garota que te fez trilhar esse caminho! Não ouça
tanto de seu pai, de sua mãe, ou até amigos! Mas sobre soube de sua amada! –
gritava com força Thror.
Lacktum balbuciava:
-Meu amor... Minha linda mulher... Minha noiva... E minha
mãe, meus amigos do feudo e até mesmo minha irmã... Todos se foram.
-Mas eles não iriam...
E quando Thror continuava falar sobre isso, um novo som
surgiu. Quando o guerreiro grego iria conseguir puxar o aliado, estrondo
ocorreu. Um solavanco no navio fez com que os homens pendurados no mastro
saltaram contra a vontade. Eles iriam cair no deque do navio se ninguém fizesse
algo a respeito.
Os dois caiam. Thror era o único com a mente livre. Ele
precisava salvar a si e ao louco Lacktum, já que um não sobreviveria sem o
outro em relação a isso. Sempre necessitam um do outro, como amigos. Talvez
como irmãos.
Lembrou-se, em uma fração de segundos do jovem e ranzinza que
odiou no vilarejo de Starten. Um esnobe, um homem sem moral, um ser maligno. E
mudou tanto no prazo de só alguns meses que nem imaginaria sua vida sem ele.
Não perderia tão bom amigo.
Suas mãos reagiram mais rapidamente que o corpo algo que lhe
causaria problemas. Ele tinha certeza.
Como o impulso do vento, ele se lançou em direção ao jovem
amigo. Como quando se mergulha no mar. O problema é que mesmo estando em águas
tempestuosas, eles cairiam na parte de madeira do navio. Ele segurou o aliado
tentando lhe proteger na queda pelo menos. Agora, era saber como ficariam menos
machucados. Ou pelo menos fazer a inútil proeza sobre o ar de não obter nenhuma
ferida quando chegassem ao chão.
Ele brincava em sua mente, com tudo que estava ocorrendo ali,
mas sabia que poderia morrer com a queda.
De repente, mais rápido que o vento – ou os trovões que
surgiam – estendeu um dos membros superiores que segurou o mastro. Quase
partindo o próprio braço ele se prendeu com força para segurar a si e ao amigo.
As unhas partindo e o sangue surgiu na mão. E eles então caíram no meio do
navio. Lacktum desacordado e Thror ferido. Era o que ocorreu com os dois
Dragões.
Os homens comandados por Joseph rodeavam os dois que caíram
ao chão do navio. Eles temiam que dos jovens membros do grupo estivesse morto.
Só que Thror sentia uma dor extrema, enquanto Lacktum estava desacordado.
Arctus se aproximou para lançar uma de suas preces de cura.
Com a força de sua fé, o padre curou o corpo e boa parte do braço deslocado do
grego. O ferido guerreiro levantou-se com certa dificuldade. Afinal, magias
divinas curavam, mas não retiravam toda a dor.
O paladino, que só recentemente saiu de sua cabine, pois
antes dormia – de todos os Dragões, Gustavo tinha o sono mais pesado – fitou
furioso o mago desmaiado. Quando iria golpear o arcano, foi detido por Thror.
-Me diga um bom motivo para não pegar esse ensandecido... E
lançá-lo ao mar!
-Pois ele é nosso líder! Mas o que eu quero mesmo saber...
Quem foi o idiota... A criatura com menos intelecto do que eu... Que entregou o
livro ele. Quem foi?
-Juro que não fui eu! – disse Seton com medo. Era até cômico
ver que o guerreiro se fazia ser temido mesmo total ou parcialmente ferido.
Isso além de sempre se depreciar.
-Precisamos estar unido neste momento! Não importa quem fez
algo certo ou errado! Mas quem esta do nosso lado! Isso importa!
Os membros do grupo se olharam como se tivessem visto outro
Thror. Algo novo mudava lentamente na mente dura e cheia de cicatrizes do
grego.
Joseph havia se calado até então. Porém, ele quebrou seu
silêncio. Não para repreendê-los. Era um aviso.
-Dragões! Espero que tenham parado suas brigas. Pois vejam, é
que os deuses do trovão nos presenteiam com um dos seus maiores dons.
Nesse momento, trovões rasgaram os céus como se o som de um
animal, ou de um demônio, tivesse feito tal façanha. As gotas de água tocavam
os homens como pedaços de ferro batendo em seus corpos. As nuvens tornavam o
dia em noite. Os mais fortes ventos surgem com a força de Zeus, Júpiter, Thor
ou quaisquer outras divindades. O único problema é que aquilo não era do
divino. E se não fosse dessa fonte só poderia ser do outro lado daquela moeda.
Algo se agitava na água.
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