Já fazia alguns dias e o grupo se recuperava do surto de
loucura que o inglês deve nos últimos dias. Ele pediu desculpas a todos, até
mesmo a Rufgar, que seria o alvo da fúria do mago. Após muitas conversas e
teorias sobre o livro, Halphy e Arctus guardaram o códice longe de Lacktum, com
medo de um novo ataque. Foi uma decisão bem acertada pelo que Alexander comentou,
usando como referência o que Seton falou da torre de Azerov.
Mas o caminho que eles trilhavam, não ajudava muito no
processo de recuperação de seus membros. Eram colinas atrás de colinas, morros
atrás de morros e os Dragões da Justiça ficavam exaustos atravessando aquele
reino. Mas graças ao auxilio de Fiel e Alexander, se tornava mais fácil. O cão
encontrava rastros, protegendo o grupo de conflitos contra ogros, anões e até
mortos famintos. A águia conseguia mostrar caminhos mais rápidos e seguros até
o objetivo do grupo. Era uma boa equipe, não fossem por estarem cansados.
Em mais alguns dias chegariam às fronteiras.
Em uma manhã, quando a neve caia forte, todos olhavam ao
longe um destacamento passando por eles. Não muito perto, mas o bastante para
se saber que havia cerca de seis deles. O pior é que a águia não conseguia voar
para sobrevoar devido ao tempo.
-O que acha Lacktum? – perguntou Arctus em dúvida, cobrindo o
rosto contra a neve.
-Não sei... Mas anões e ogros não devem ser. O tamanho não
bate com eles. E nem andam como um dos mortos famintos. Estamos próximos das
fronteiras então talvez possamos até pedir ajuda. Nossas provisões acabaram
ontem.
-Talvez sejam soldados ou camponeses fugindo – disse Gustavo,
arrumando seu elmo.
-Eu acho que são soldados – falou Thror.
-Detesto concordar com o careca com X na cabeça, mas também
acho que sejam soldados – completou Halphy – Chamem de intuição.
-Vamos ao encontro deles – terminou Lacktum enquanto corria
na direção do grupo desconhecido.
-Lacktum, eu não... – mesmo com Halphy insistindo para que
não fossem até os estranhos.
-Deixe Brown – falou sem muita empolgação sobre o mago.
Ele se cansava das decisões de Lacktum. Apesar de ser o
líder, o ruivo só trazia problemas. Era necessário alguém mais firme. E
rapidamente.
Quando caminhavam, os passos foram se tornando mais pesados
para alcançar eles. O mago ficava com medo de perdê-los. E depois de um bom
tempo, alcançaram o grupo. Era difícil a visão até mesmo para aqueles que
estavam tão próximos um do outro. Lacktum foi mais a frente conversar com eles.
-Olá? Chamo-me Lacktum e estou aqui...
Só que quando o mago iria conversar com um dos supostos
homens, ele notou que não era bem isso que ele era. Lacktum conseguiu ver o que
um revenant é. O resultado dos experimentos alquímicos de Paracelso, uma
armadura animada, que age e pensa como uma pessoa. Não tão rápidas como os
humanos, mas assim mesmo, ótimos combatentes. Feitos de armaduras pesadas como
cotas de talas, lorigas, peitorais de aço e até armaduras de batalhas. De
longe, realmente pareciam humanos cobertos dos pés a cabeça. Usavam até elmos.
Mas de perto, poderia se notar um construto com alma transmutada em um grande
pedaço de metal ou outro material. Eles não pareciam ter piedade, assim como a
criatura mitológica que originou o nome dessas criaturas.
Quando Lacktum notou que o elmo estava vazio, deu um passo
para trás com medo.
-Dragões da Justiça, ergam suas armas! – soltou Arctus em
socorro ao mago.
Thror saltou espada e escudo contra o revenant que iria
atacar Lacktum. Com a arma curta, atravessou a liga metálica que tinha vida
própria. Mas isso não foi o suficiente para fazer o construto tombar. Tanto que
ele golpeou no peito com uma lança. Foi um golpe quase perfeito. E quase, não
significa morte. Pelo menos não para o grego da cicatriz.
O sacerdote Arctus aproveitou e golpeou algo que deveria ser
a cabeça da criatura. Um ataque desses mataria um homem comum, mas não estes
seres desprovidos de um corpo carnal. Mas o sacerdote prosseguiu no ataque, não
deixando espaço para qualquer ataque contra si. A monstruosidade também não
parava.
Halphy não achava problemas para enfrentar o seu adversário,
mesmo não possuindo um ponto vital para explorar. Ela obtinha bons resultados
fazendo vários ataques. Além disso, o machado não tocava seu corpo, assim como,
um gato foge de cães. E a meio elfa uma gatuna.
Um dos que mais temia o combate, era Gustavo. Ele conseguia
sentir, que dentro das armaduras, não havia mal. Estes seres poderiam ser um
processo de alquimia e necromância, mas almas dentro das armaduras não eram
tocadas pelas trevas. Mesmo assim, o paladino tinha que combater, pois era sua
vida que estava em jogo.
Sua espada longa teria atravessado um corpo feito de carne.
Mas os revenants eram perigosos e resistentes. Agüentavam duros golpes, e não
gemiam de dor. Na verdade, só soltavam um estranho barulho, que mais parecia
rangidos de uma porta. Eram soldados perfeitos que não se cansavam, nem dormiam
ou se alimentavam. Mas Gustavo acreditava que era possível derrotar o inimigo
feito de malha.
Os únicos que possuíam problema no combate eram Seton e
Lacktum. O druida foi proteger o arcano, mas acabou com problemas, já que o
aliado caiu no chão. Ou seja, era necessário enfrentar dois oponentes. Com a foice,
separava os oponentes deles.
Ele gritou sua arma acertando as duas pontas nos oponentes.
Não causou grandes efeitos.
-Lacktum! Faça alguma coisa! – gritou o druida em desespero.
-Já farei
Seton! My finger lead the force of thunder.
E eis que nenhuma chama surgiu nas criaturas de metal, mas
era possível notar nelas uma coloração forte como se estivessem sendo forjadas
novamente. Porém, uma delas caiu imediatamente após o uso da magia.
Isso aguçou a mente de Lacktum, que partiu em direção da
armadura. Seton gritou para o companheiro, pedindo auxílio, mas esse o ignorou
em nome de sua curiosidade.
O arcano chegou até a armadura procurando por algo que nem
ele sabia o que era. Foi quando, ao olhar dentro da armadura um pentáculo. Ele
parecia ter sido inscrito com uma faca de metal. Porém, derreteu no momento em
que a magia se tornava mais poderosa. O que o levou a uma conclusão:
-Existem pentáculos[1]
nas armaduras! Os destruam e acabaremos com eles!
Agora havia só cinco armaduras e o grupo precisava proteger a
si mesmos a aos animais. Alexander e Fiel se mantinham calmos e observando tudo
ao redor, para auxiliar em caso de problemas. Caça-Trufas já segurava Valente
pelo rabo para impedi-lo de entrar no conflito. Mas o jovem suricate, se perdia
no meio de toda a neve que caia.
A maré da batalha mudou isso era certo. Os golpes de grupo
eram mais precisos. Como única exceção estava Thror que não sabia o que era um
pentáculo.
Gustavo então rogou aos céus, enquanto erguia sua lamina para
trás:
-Que o aço aqui forjado, se torne arma para as minhas
vontades se tornarem realidade. Que Deus proteja a mim e aqueles que amo.
Foi quando, a lâmina de sua espada longa desceu com a fúria
de um sol. Abriu uma grande brecha na armadura viva. Com um olhar atento, o
paladino conseguiu a notar um pentáculo dentro de aquele ser. Quando viu o
revenant pegou sua espada tentando destruir o paladino. O guerreiro sagrado
destruiu o símbolo contido na parte mais firme do metal, atravessando a
armadura.
Thror gritou para todos.
-O que é um pentáculo?
Enquanto todos lutavam, alguns olharam com ar de
estranhamente para o grego. Como ele poderia ser tão estúpido? Ele não sabia o
que é um símbolo arcano! Mas não era o momento para isso: o guerreiro da
cicatriz estava muito ferido por um golpe que sofreu quase trespassando seu
coração. O que ele não contava era com uma frase de Arctus:
-Pentáculo é um desenho!
Então, Thror abriu a guarda da criatura. Nesse momento, a
armadura caiu no chão como uma fruta madura. O guerreiro saltou em direção da
criatura a impedindo de levantar. Com o escudo, bateu no elmo do revenant.
Então viu dentro da armadura um estranho desenho.
-Tem que ser esse!
Quando falou isso, com a espada curta, riscou o símbolo com
força. Rápido o bastante para que não fosse golpeado pela lança.
-Tivessem falado que era um daqueles símbolos que o Lacktum
sempre vê nos livros. Seria mais fácil para mim!
A batalha se mantinha ferrenha.
Seton já havia dominado seu adversário. O problema é que
nenhum dos dois conseguia acertar um ao outro. Mesmo assim, o druida tinha
vontade de acertar o adversário da mesma forma que fez com o outro. Não
conseguiu.
O revenant estava preparado para qualquer ataque. Parecia que
aprendiam, entendiam e sabiam como desviar dos golpes. Com a maça, tentava fazer
um ataque em resposta ao jovem druida. Nada ocorria de diferente.
E então, eis que surgiu Gustavo com sua espada longa
atravessando as costas do construto. Mas o símbolo estava na parte da frente,
por dentro da armadura. Isso não causou nenhum efeito no ser.
Mas agora, ele tinha que lidar com dois adversários. Seria um
desafio.
Halphy lidava com o monstro como uma menina que brinca. A
criatura estava muito ferida, se é que se pode falar isso em um caso assim.
Havia várias marcas na cota de malha vazia e não tinha mais apoio, afinal, suas
pernas haviam sido cortadas pela adaga certeira dela. Eis que o monstro caiu
diante depois de tanto tempo.
-Esses monstros se enfraquecem depois de muitos golpes! –
disse Halphy girando a adaga – Devem estar muito feridas agora! Ataquem com
tudo!
Nesse instante, do dedo de Lacktum saltou um pequeno raio de eneregia
pura.
- Hell fills
up this fire, but he will attain my enemies!
A criatura foi afetada pelo fogo do arcano ruivo. Mas nem
tanto quanto o jovem queria. Ela não se abalou pelo golpe de energia. Na
verdade, era até possível comparar o dano recebido um pequeno corte na pele. E
não a explosão de energia que surgiu subitamente com a magia.
O que a criatura não contava, era com o poderoso golpe da
espada de Thror, pelas costas, enquanto segurava o elmo. Era como se estivesse
segurando a cabeça de um inimigo, ele tombou diante das botas do grego.
-Thror... – iria começar a falar o mago.
-Não precisa se preocupar em me agradecer! Notei que este
saiu de perto do clérigo...
-Não iria agradecer! – disse Lacktum contrariado – Só queria
saber o motivo de continuar a segurar o elmo com a mão do escudo.
Foi então que o homem da cicatriz olhou para o elmo. Então, o
jogou no chão com receio que ganhasse vida de novo.
Seton ainda tinha dificuldades em enfrentar o seu oponente,
pois além de ter se afastado de seus aliados, ficou encarregado do anão Rufgar.
Ele não poderia largar o prisioneiro que poderia delatar o grupo. Foi nesse
tempo, que o revenant se aproximou o bastante para fazer golpe perfeito. Mas
foi interrompido pelo corpo do anão, que saltou servindo como escudo.
-Vai druida!
Foi como em um piscar de olhos: a foice atravessando o
revenant, enquanto o anão caia de dor. O construto também caiu.
-Ei barbudo, esta bem? – soltou o aflito druida.
-Não acha... Que uma espada curta irá me matar, não é?
Seton sorriu e começou os procedimentos mágicos de cura no
peito do anão.
Todos foram até o anão. Exceto Lacktum que parecia querer
contemplar a vitória. Viu Halphy ajudando o padre. Também viu o jovem Gustavo cumprimentando
Thror pelos excelentes golpes desferidos. Viu a raiva de Valente por não
participar do combate, enquanto Caça Trufas se sentia aliviado. Alexander e
Fiel estavam alegres, só pelo fato, de todos estarem bem. E como todos se
reuniram ao redor de Rufgar para saber se ele estava bem.
O que ele não viu, foi o golpe de uma adaga em suas costas.
-Mestres Hazik e Kalic Benton II mandam lembranças... Disse
uma voz.
Lacktum então ouviu o metal se afastando do corpo. Ele colocou
a mão nas costas e tentou olhar a palma da mão. Não houve tempo. Caiu
inconsciente no chão.
-Ruivo! – gritou Thror.
-Lacktum! – gritou Halphy.
-Mas o... – e antes que Arctus terminasse a frase, entendeu o
que foi dito pelos companheiros. Ele conseguia ver, próximo do corpo
inconsciente do mago. Lacktum, um homem de vestes negras, capa vermelha e usava
um capuz para esconder sua face. Segurava uma adaga grande cheia de um líquido
vermelho e negro que escorria de sua lâmina. Apontando para o grupo, saltou:
-Meus mestres querem os itens do Desalmado e do Cavaleiro de
Platina! Com isso seu colega poderá viver! Estarei naquela direção – disse
apontando para um morro - e quero que cheguem
antes do anoitecer... Se não...
E nesse instante, o assassino fantasmagórico sumiu com a
mesma velocidade que surgiu. Com a ajuda da neve naquele lugar. E a cada
momento ela ficava maior, quase cobrindo o corpo do mago.
Todos foram até seu líder caído. Ele foi erguido pela jovem
Halphy de todo aquele branco. Ela o virou procurando a ferida. Arctus e Seton
não entendiam o motivo da ladina querer ver o golpe no corpo do mago antes
deles. Alguma coisa a intrincava.
Foi quando a jovem encontrou a ferida. Notou que ao redor
dela, havia uma substância esverdeada. Temeu que sua conclusão estivesse certa.
Cheirou e então a fala do estranho. Ela sabia o que era aquilo.
-Praga! Vamos encontrar um lugar seguro para deixar Lacktum!
Isso é veneno de quimera[2]! Temos
que achar uma cura ou ele não sobreviverá!
Encontraram uma caverna, não muito distante de onde tiveram o
conflito com os revenants, para deixar Lacktum mais acomodado. Era um local
cheio de pedregulhos, mas era o único lugar seguro para depositar o líder e o
colega Lacktum com aquela neve toda. Sendo que agora ela se tornou tão
poderosa.
O jovem de cabelos vermelhos continuava inconsciente e
extremamente febril. Sua pele ficava quente e seu corpo mole como uma trouxa de
roupas.
Todos se preocupavam com o destino do rapaz. Caça-Trufas era
só choro, enquanto Valente se mantinha ao lado do mago, esperando a melhora do
amigo. Todos os outros se entreolhavam. Como se cada um quisesse que o
companheiro ao seu lado tivesse a resposta para aquela situação.
-Vamos até onde ele esta – disse Halphy com toda a certeza em
sua voz.
-Ele? Refere-se aquele homem encapuzado? – soltou Arctus
estranhando.
-Sim. Não temos opção. Conheço o veneno e ele trará a morte
ao Lacktum quando o dia raiar... Ou até antes.
-Mas então temos muito tempo para conseguir a cura – disse
Thror aliviado.
-Não é bem por ai – respondeu a ladina – É certeza que ele
irá morrer quando amanhecer! Temos que encontrar aquele estranho!
-Mas você acha que ele realmente deve ter essa cura? –
perguntou Arctus com medo da resposta.
Halphy ficou calada, como se tentasse achar a resposta. Olhou
para a mochila e a pegou.
-Você vai levar a mochila dele? Qual o motivo? – perguntou um
Seton assustado.
-Os itens estão divididos entre nós. Um deles esta com Thror.
Outro com Gustavo, pois foi o item que causou a morte de seu irmão. Tanto que
Lacktum, Azerov e eu decidimos isso. Faltam então os dois itens que Lacktum
possui. Até onde percebi, a máscara é o principal problema do conjunto do
Desalmado. Parece ter vida própria e fica mais poderosa com os outros dois. Vou
levar a máscara, pois se houver o problema de ser roubada, pelo menos nos
livraremos do item que nos traz mais inimigos. Mas não podemos deixar que a
busca por essas coisas, traga um mal tão grande para Lacktum. Ele sofreu
tanto... E não merece...
Gustavo colocou a mão no ombro do jovem. Ele balançou a
cabeça como se negasse seus próprios pensamentos.
-Vamos com você – disse Gustavo.
-Sim, mas só vão comigo Thror e você. O resto fica para
cuidar do inglês. E não adianta querer vir comigo Valente. Os itens de Platina
ficam.
-Tudo bem – soltou meio triste o suricate. Afeiçoou-se ao
mago. Talvez por ser tão impertinente quanto ele. Preferiu ficar ao seu lado.
Seton e Arctus conseguem cuidar dele? – perguntou Gustavo.
Eles simplesmente confirmaram com a cabeça. Não havia o que
se fazer, a não ser tentar manter o amigo bem.
-Tomem isso, é uma erva para neutralizar venenos. Vamos então
os outros – terminou Halphy, para saírem daquele lugar.
E o grupo formado por três pessoas atravessou a neve forte e
perigosa das terras inglesas. Enquanto a febre crescia no corpo do mago Van
Kristen.
O caminho era difícil. A neve atingia a cintura de todos e
tornava quase impossível andar. Mas aquele não era um momento para pensar nas
dificuldades.
Aqueles três cruzavam o oceano branco composto de gelo.
Causaria medo até em pessoas experiente. Mas isso não era algo para se ter
naquela situação. Um dos seus estava com sérios problemas.
Gustavo e Thror acompanhavam a ladina. Ela nunca se colocou
na posição de líder, mas não seria o melhor momento para isso. Mais de cinco
meses se passaram desde que começaram a viver como companheiros. Gor era o
líder no começo, mas mesmo Halphy notou que o soldado inglês não servia como
líder. Mas o jovem de cabelo de fogo se mostrou um líder destemido nos momentos
de dificuldades. Isso foi mais claro com o ataque na torre de Azerov tomando as
rédeas da situação. Ele sabia ser mais capaz do que o mago, mas era melhor o
peso da liderança dos Dragões da Justiça nas costas dele do que nela. O que
deveria fazer? O que qualquer um faria no seu lugar? O que ele faria no seu
lugar?
-Halphy! – gritou Thror.
-O que foi?
-Como vamos atacar aquele homem? Que estratégia fará?
-Eu ainda não sei! Mas imagino quem seja! – falou a garota
apressadamente.
-Quem seria? – perguntou Gustavo.
-Augustus! O especialista em assassinatos! Já estudei métodos
para matar e combinam com o de um famoso homem que aprendeu sobre esse tipo de
arte com orientais!
-Mas espere um pouco... – falou desorientado o paladino –
Quer dizer que os membros do Tigre Demoníaco já estão de olho em nós? Isso é um
absurdo!
-E o que isso tem de tão importante? Não importa - falou isso
a ladina alterando o tom de voz mais ainda – o Lacktum esta sofrendo inconsciente
naquela maldita caverna! E o único método de tratar veneno de quimera é uma
pétala de lótus[3]!
Só através disso vamos recuperar ele! Então, ou agimos agora, ou perdemos!
Quando Halphy iria voltar a caminhar, foi impedida por
Gustavo, que segurou em seu ombro.
-O que foi agora?
-Nós vamos salvar eles?
Halphy se manteve firme. Uma mulher era quase sempre
consolada em um caso desses, mas não era isso que ela queria. Odiava que a
tratassem como uma garota fraca, mas ela sabia que era natural tal atitude,
vindo de homens. Era o momento de Halphy mostrar o que era líder.
-Onde... Estamos?
Lacktum falava isso, enquanto acordava. Ao seu redor estavam
Valente, Furta-Trufas, Fiel e Alexander, todos quietos. O suricate chorava pelo
mago. Isso era notável.
-Em uma caverna a leste de onde fomos atacados – respondeu
Alexander.
-Onde estão os outros?
-Arctus e Seton estão na saída da caverna, vigiando. Thror,
Gustavo e Halphy foram atrás do assassino. Ele talvez possua a cura para o
veneno que esta em seu corpo. Rufgar esta com Seton.
-Veneno? – o mago se ajeitou, mesmo com a dor que sentia no
corpo. O corpo ardia. E quando o ponto onde havia sido atacado tocava a parede
da caverna, ardia mais ainda.
-E... Mas onde estão meus itens?
-Halphy os levou.
-Como? Maldita ladina!
-Isso ela fez para te salvar – gritou Valente irritado com a
atitude do arcano.
-Calma... Calma – falava Furta-Trufas para tentar acalmar o
companheiro animal.
-Halphy pensou que, já que o inimigo quer os itens, valeria
mais a pena perder a máscara que os outros itens – Alexander disse.
-Verdade – consentiu o mago – isso bem o jeito dela de
pensar. E bem certo confesso.
-Também é o seu jeito.
-É... Isso é verdade...
-Me diga – começou Alexander, alterando o tom da conversa –
você esta triste o tempo todo. Qual o motivo disso?
Foi então que Lacktum notou que as memórias de seu triste
passado ainda o marcavam. As imagens de seu pai, mãe, irmã e sua noiva sumiam
em sua mente. Assim também ocorria com o que se lembrava de Azerov. As pessoas
surgiam e sumiam em sua vida. E o pobre Federick, que lhe surgia como um
fantasma devido ao seu irmão. Ele comentou tudo aos amigos animais.
Alexander se compadeceu do sofrimento do mago. Mas falou:
-Você agora lidera um grupo de companheiros leais. Aliados
que estão dispostos a arriscar suas vidas pela sua. O veneno não é só
proveniente de serpente ou criaturas das trevas. Ele vem também das trevas que
surgem no coração. Corroem a alma e o espírito. Esse veneno nós causa tanto
frio que sentimos nos tornando outras pessoas. Pois, um veneno altera tudo que
há por dentro, sendo forte ou fraco fisicamente. E nem mesmo um arcano com
tamanha inteligência como você pode sobreviver contra esse veneno. Só quando
seu coração se livrar do mal que reside nele... Haverá uma pequena chance de
redenção. Pois a vingança não trará seus entes e amigos queridos de volta. Só
fará com que perca o pouco que lhe resta de bom em sua vida. Matar por matar é
matar. Matar para proteger algo ou alguém, é algo de valor verdadeiro.
-É fácil falar! – se revoltou Lacktum – Não foram vocês que
perderam aqueles que amavam!
-E isso lhe concede algum direito divino? Algum poder digno
do deus da vingança? E nunca se esqueça: sempre se pode perder mais! Um coração
com uma ferida não é algo incomum. Mas se o seu coração se encher de trevas,
causará desgraça aos que estão ao seu redor.
O jovem virou seu rosto. Com a dor, parecia que dormiu
rapidamente. Alexander pegou uma coberta e cobriu o arcano, como o bom cão que
era.
-O que acha Alexande? – perguntou Fiel, em cima de uma pedra.
Valente se aninhou ao lado do mago. Furta-Trufas chorava com
medo da sina de seu amigo.
-Eu não sei Fiel... Eu não sei.
-Vejam! Falta pouco até o morro.
Thror gritava isso como um cão que encontra a caça para seu
dono. Havia uma parte no morro que subia em uma espécie de ladeira natural.
Pelo que se notava era o único lugar onde haveria alguém naquele frio todo.
Deveria ser ali que se escondia o maldito homem.
Halphy já ouviu falar sobre os assassinos. Os homens das
terras escaldantes do Oriente. O temor aumentava no coração dela. Por isso, ela
criou um plano: ela apareceria na frente do encapuzado, sozinha. Assim, o
fazendoele acreditar que o grupo deixou à ladina ir sozinha até o lugar
marcado. Era quase certeza que outro ponto de acesso existia naquele lugar.
Podendo fazer uma emboscada ao inimigo. Ela sabia que isso era pouco provável,
mas tinham que tentar.
O paladino e o guerreiro começaram a contornar o lugar.
Enquanto isso, a ladina se tornou a isca para seu próprio plano.
Era necessário se manter calmo. O assassino não deveria
suspeitar, nem um pouco, sobre as ações dela. A vida de Lacktum dependia disso.
Demorou um para conseguir conceder tempo aos seus amigos.
Quando viu o homem ele estava em uma parte da ladeira do lugar.
Estava sem capuz, mostrando a pele morena com um par de olhos azuis. Ele
portava outra arma. Uma espada, mas pelo que Halphy notava, ela não parecia
estar envenenada como a outra. Mas todo o perigo poderia estar escondido em
pequenas coisas.
Ele começou:
-Halphy Brown.
-Augustus, não é?
-Há! Minha fama me precede.
-Não muito, mas sei o suficiente para distinguir um ladrão de
um assassino.
Eles não se aproximaram o bastante para um golpe de suas
respectivas lâminas, mas não estavam tão longe que não pudessem notar suas
ações. Augustus sorriu e falou:
-Sim. Estou aqui para obter os itens. E deve estar com, no
mínimo, a máscara.
-Item pequeno. Fácil de colocar na mochila. Óbvio.
-Bem óbvio.
-Mas o que mais quer?
-Como? – falou sarcasticamente Augustus.
-Usar uma arma com veneno em Lacktum. Falar para se encontrar
com você, criando a idéia que possui uma cura para o veneno de quimera. Se você
estava só querendo um dos itens, por qual motivo não o matou logo? O que você
quer, tem relação com o ruivo. E quero que me diga agora.
Foi então que o assassino se mostrou surpreso. Ele
superestimou a garota. Deveria ter obtido mais dados sobre ela. Apesar de que
tinha ordens expressas de não se atrever a mexer um fio de cabelo de Halphy.
-Você é muito perspicaz menina... Para uma fealith. Mas
existe uma falha em seus planos.
-Como?
-Não pense que me engana garota. E fale para seus amigos
tentarem fazer menos barulho.
Nesse momento, Thror deveria estar acreditando que não criava
nenhum barulho com sua enorme coleção de armas e sua armadura. Além de que, sua
vantagem do terreno não era mais tão ampla devido ao assassino ter descoberto
sua presença. Estavam, ele e Gustavo no alto da formação.
-Já ouviu falar em ser discreto? – falou baixo o guerreiro
sagrado.
-O que é isso? – ficou realmente curioso o grego.
-Agora imagino como meu irmão foi morto! Por Deus!
Mesmo estando em minoria, Augustus não demonstrava estar em
situação desfavorável. Ele sabia que os mais precipitados estavam entre os
guerreiros. Ou seja, os mais descuidados.
Enquanto pensava isso, Halphy sacou sua besta disparando o
conteúdo da arma contra o estranho. O virote passou próximo do pescoço, quase o
ferindo mortalmente. Mas não foi o bastante.
Ele aproveitou esse ataque e sumiu em pleno ar.
Agora os Dragões estavam em perigo.
Não era magia. Halphy tinha noção disso através de seus dons
arcanos, o que necessitaria de componentes verbais e gestuais. Aquilo era um
truque avançado, prestidigitação, não a Arte.
Ela tinha que se preparar para o ataque iminente do inimigo.
O assassino Augustus deveria manter a si mesmo nas sombras para conseguir
continuar com o truque. De onde partiria o golpe era uma incógnita. Mas nem
tanto se ela estivesse certa. O inimigo talvez não a atacasse, pois ladrões e
assassino usavam habilidades parecidas que poderiam anular um ao outro, e
naquela conversa ela conseguiu o deixar confusa sobre si. Mas o caso de Thror e
Gustavo era diferente. O alvo mais provável era o grego que não possuía grande
poder defensivo. Ela mesma acharia mais fácil eliminar ele primeiro.
-Thror, fuja! – ela gritou.
Mas era tarde. Do mesmo modo que sumiu, ele surgiu ao lado de
Gustavo, o atingindo em um ponto preciso de seu corpo. O que fez com que o
paladino ficasse completamente paralisado. Deixando Thror completamente
desguarnecido. A meio elfa não pensou nisso.
Augustus rapidamente conseguiu render o grego, segurando seu
corpo com uma mão e com a outra encostava a arma no pescoço do mesmo. Thror
pensou em usar a força para se soltar do assassino. Só que era difícil na atual
situação.
-Se você mexer qualquer parte de seu corpo – falou o
assassino Augustus – eu não mato só você cicatriz, como levo o seu amiguinho
parado aqui do lado! Agora quieto.
-Ora seu...
-Thror, não se mexa! – implorou Halphy. Ao ouvir isso, ele
aquietou como uma estátua.
Gustavo estava parado como em uma posição de defesa. Quando o
golpe paralisante o afetou, fez com que o paladino ficasse assim. A dor tinha
sido tremenda, mas se sentia inútil naquela situação e por ter caído nela.
Augustus então guardou a arma que usava para pegar entre seus
pertences, um pequeno saco que exalava um perfume adocicado. Thror se lembra do
cheiro, não sabia de onde, mas era conhecido.
Ele então jogou o pequeno item aos pés de Halphy. Essa
constatou imediatamente que se tratava de uma pétala da flor rara. Memórias
voltaram para a meio elfa. Mas as ignorou.
-Agora imagino parte do que seja tudo isso! Kalic Benton II
não quer matar nem a mim, nem a Lacktum. Já suspeito do motivo. Mas mesmo assim
– olhou Halphy para o pequeno saco – muito grato Augustus.
-Esta bem. Bem então... – quando o inimigo iria se despedir
surgiu um raio de energia do nada. Do lugar que ficava entre Halphy e Augustus
surgiu uma forma que começou como transparente, mas foi tomando uma forma mais
definida e concreta. Era Lacktum, que não conseguiu atingir Augustus.
-Lacktum! – gritaram os dois colegas quase ao mesmo tempo.
-Muito bem Van Kristen – falou novamente de forma sarcástica
o assassino – Mas falta muito para me pegar com um truque dessa categoria.
Adeus, donzela Brown.
Nesse instante, sumiu novamente largando Thror que caiu no
chão enquanto tentava sacar sua espada. Tudo em vão. O assassino sozinho
conseguiu vencer sozinho, os Dragões da Justiça. Não era momento para se manter
pensando nisso de qualquer forma. Lacktum que estava com o braço estendido
devido a magia, caiu ao chão, quase morto. O veneno fazia efeito.
Halphy chegou ao corpo frágil e febril do arcano. Ele parecia
tão quente quanto uma fogueira. Ele balbuciava e espumava pela boca. Era
horrível.
Com certeza, Lacktum aproveitou uma distração de todos na
caverna para nublar a visão de seu corpo, pensou a jovem. Mas não era hora para
refletir sobre isso. Ajoelhou-se rapidamente.
Colocou a pétala de lótus na boca do mago. Forçou a boca do
mesmo para mastigar. Ele mal tinha força para isso.
-Vamos cabeça de fogo! Fique vivo! Anda!
Nenhuma reação.
Thror levou Gustavo até próximo dos amigos. O corpo do
paladino continuava adormecido, mas começava a sentir mobilidade em seus
membros. Pelo menos estava melhor que Lacktum
Continuava sem nenhuma reação.
Halphy colocou a mão no chão em desespero. Ela tremeu quase
chorando, assim como os outros. Foi quando ela sentiu algumas batidas afetuosas
na cabeça e uma voz fraca, mas sarcástica dizendo:
-Você fez o que pode Brown...
Ela levantou a cabeça como um gato.
-Lacktum! Seu louco! – respondeu à jovem quando notou que
quem falava era o arcano petulante.
Os dois guerreiros sorriam, enquanto a jovem Halphy o
abraçava com força. Ela não chorou, mas pouco não o fez. Não era por ser
mulher, mas acabou se afeiçoando aquele romântico vingativo.
-Ai! Me solta Halphy! Eu ainda estou ferido esqueceu? –
começou a rir enquanto falava isso.
[1] Um
símbolo geométrico que consiste em uma estrela de cinco pontas com traçado
contínuo. É o símbolo chave dos magos e sacerdotes de origem celta.
[2] O
veneno da quimera é duas vezes mais potente que qualquer elixir, mineral ou
veneno proveniente direto da natureza.
[3] A
lôtus teria várias propriedades como anular completamente venenos, recuperar
mana e até mesmo curar corpos.
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