Muitos no grupo estavam feridos pelo deslizamento de terra
que ocorreu, graças a Olho de Carvalho. Os meros atingidos foram os animais e
Thror. Por algum motivo, não confiavam muito no plano de Lacktum. E de certo
modo, estavam corretos nesse pensamento, por incrível que pareça. Então eles
preferiram se adiantar.
Mas já os outros, Lacktum e Arctus, haviam se machucado
gravemente. O braço do mago estava extremamente inchado. Já o padre reclamava
de suas costas. Uma pedra o acertou pouco abaixo do personagem.
Gustavo havia sido ferido na testa. Mas nada com que se
preocupar.
Mas foi então que Seton notou algo que se o aterrorizou:
-Onde esta Halphy?
Lacktum ainda não havia reparado isso. A jovem ladina teria
adentrado mais na caverna. Só havia uma opção então.
-Halphy! – Lacktum gritou apreensivo.
Ele começou a tirar as pedras que tampavam a entrada da
caverna. Às vezes usava as mãos, outras a própria adaga. Era necessário salvar
a ladina feitceira, pois ela era necessária para o grupo. E uma amiga com
certeza. Mas ainda não estava no tempo de admitir isso.
Os outros ajudavam, mas já imaginavam o pior. A jovem
perecendo sob os escombros. Era algo que não poderiam acreditar. Pelo menos não
depois do tanto que passaram juntos. Era como perder alguém da família, uma
pessoa realmente querida. Havia sempre desentendimentos com ela, mas lá estava
a feiticeira ladina, pronta para ajudar sempre rindo um pouco no processo, ou
concedendo uma de suas famosas broncas. Fosse como uma ladina, ou feiticeira, o
que realmente importava é que aquela meio elfa não se deixava abater por
qualquer que fosse o motivo. Sendo uma mulher, muitos pensavam que seria mais
sensível e fraca em seus sentimentos, mas ela contornava isso. Ela não era como
os jovens comuns. Talvez fosse por uma meio sidhe, ou por ser tão bela, ou
talvez ainda seja por ser mulher, mas ela sempre se superava em suas atitudes.
Não mas exatamente o contrário. Halphy fazia as coisas, pois acreditava no que
queria para si. Mais do que qualquer um naquele grupo, a vontade da jovem
mostrava que era necessário ser você mesmo, custasse o que fosse.
O mago retirava as pedras de cima do que achava ser o corpo
da companheira. Foi quando Arctus segurou o braço de Lacktum.
-Van Kristen! – o padre gritou – Pare com isso! Ela se foi.
-Não! Ela tem que estar viva. Não é Thror?
-Isso mesmo! – falou o grego tirando uma boa parte das pedras
naquele lugar.
-Parem! – soltou novamente Arctus – Vocês não entendem que
ela mor...
Foi escutada então, uma pequena tosse. Logo em seguida, uma
voz cheia de raiva disse:
-Quer me matar seu bando de idiotas? Se quiserem isso, seria
melhor se parassem de me matar com conversas tediosas.
Então, Thror retirou algumas pedras de onde ouviu aquelas
palavras. E lá estava à suja e empoeirada meio elfa. Possuia um sorriso
malicioso, como de costume.
-Vocês homens humanos falam cada coisa sem sentido.
Foi quando Lacktum e Thror abraçaram com muita força a jovem
ladina feiticeira. Os outros só olhavam a tudo sorrindo muito, até os animais.
Era comovente ver que o grupo realmente estava se tornando mais que isso. Uma família.
-Olhe – começou novamente Halphy – eu até entendo o careca,
mas qual o motivo de você me abraçar ruivo?
-Ah – meio constrangido falou o mago inglês – como
sobreviveu?
-Isso? Eu acho que cai em cima dele – falando isso, levantou
um assustado, porém vivo Furta Trufas – Ele é pequeno, mas bem gordo e macio.
Valente então exclamou:
-Só poderia ser o furão!
Seton já estava melhor, foi o que disse a todos. Iriam
prosseguir.
Eles se preparavam para descer o túnel da caverna. Todos
aqueles que manipulavam a magia aprontaram seus encantos, enquanto os outros
levantavam suas armas mais afiadas e poderosas. Era um inimigo novo, mas acima
de tudo, desconhecido para todos. Qualquer coisa que servisse para vencer seria
útil. Especialmente nesse caso.
Muitos homens répteis apareceram diante dos jovens, mas foram
logo mortos. O grupo havia crescido, tanto física quanto espiritualmente. Havia
suas desavenças, mas sempre necessárias.
Os monstros eram fracos demais em combate contra os Dragões
da Justiça. Não seria um desafio digno, pensavam alguns, como o guerreiro
Thror. E eles não se rendiam, mesmo com as promessas do grupo de não causar mal
a ninguém se fizessem o que lhes foi pedido. Não sabia se era por não confiar
em humanos, ou medo de seu mestre sombrio. Fosse o líder um dragão ou algo
pior.
Mas após um bom tempo, andando pelos corredores, chegaram a
um lugar que emanava luz de tochas. Como Halphy possuía ótima visão no escuro,
preferiram não acender nenhuma chama, nem lançar magias que produziam luz.
Então, como de costume, ela seria a batedora.
Ela notou que havia um grande salão, todo iluminado, pelas
chamas que tocavam um material – que para desgosto de Halphy – não era uma das
famosas esmeraldas. O lugar era bem trabalhado, diferente dos túneis por onde
passaram. Havia um grande estandarte no meio do salão que possuía um símbolo
desconhecido. Além disso, uma marca arcana estava desenhada no chão. Ela sabia
que aquilo significava abjuração, quando se quer proteger de algo ou prender.
O que realmente marcou Halphy, era a presenças de um dragão
dourado e um marduk, como eram conhecidos os meio dragões.
Como dito antes, lendas sobre dragões existem em diversas
culturas, mas sobre a concepção de híbridos de sua raça com humanos, nada havia
sido escrito. Isso ocorria, pois dificilmente chegavam a idade adulta. Mas
havia uma clara diferença entre os fealiths e os marduks. Se os meio elfos eram
odiados, os de sangue dracônico eram temidos. Existiam lendas que falavam da
extrema força e poder inerentes em seu corpo. Dependendo do genitor – ou
genitora – dragão, seu corpo possuía características apropriadas a ele. E no
caso se tratava de um dos famosos filhos de um dragão de sangue.
Normalmente, são malignos e ferozes. São extremamente
territoriais. Excepcionalmente arrogantes e furiosos quando entravam em
combate. Assim como os híbridos, possuem coloração avermelhada, lustrosa e
brilhante. A maioria das lendas que conta sobre cavaleiros derrotando esses
monstros alados, se tratava dos lendários dos dragões do sangue. E os seus
filhos não eram diferentes.
O momento exigia cuidado redobrado. Era comentado que essas
criaturas tinham olhos e ouvidos tão poderosos, que sentiam o medo das pessoas.
Por isso que Halphy não era detectada, pensava ela.
Só havia um modo de pegar aquele ser sugeriu Lacktum que era
através das habilidades únicas da fealith. Seus dons de se esconder nas sombras
seriam bons para ferir o oponente. E com isso ela já se aproximava do alvo.
Quando chegou até ele, preparou a espada. Então, no momento do golpe, o
poderoso ser virou com os olhos reptilianos para Halphy, mesmo nas sombras,
disse:
-Olá minha linda assassina – logo após joogou uma adaga no
ombro da ladina. O golpe foi dolorido, pois o grito foi estridente.
-Urgh! Que dor!
-Brown! – gritou Arctus.
-Halphy! – falou Lacktum enquanto corria na direção da amiga.
-Ora, ora – sarcasticamente, disse o meio dragão, enquanto
via o ataque contra ele – Não são bons amigos?
Então tirou de suas costas uma lâmina curta. Ele enfrentaria
todo o grupo.
Inicialmente, o magro ruivo prendia sua mão com mana,
falando:
-His acts
are restrained. Your body will be paralyzed.
Houve uma luz veloz, que atingiu os olhos do meio dragão.
Nesse instante, Lacktum pensou ter sido bem sucedido com a magia paralisante.
Mas não foi bem assim.
-Que tal um pouco de aço no corpo cabelo de chamas? –
estendendo o braço para golpear o arcano, o marduk gritava isso de satisfação.
Não havia sido preciso, mas foi o bastante soltar uma grande quantidade de
sangue.
Seton, Gustavo e Thror atacaram praticamente juntos, mas a
poderosa criatura bloqueou. Era como se ele conseguisse ver a falha em cada
usuário daquelas armas.
Até mesmo Valente, que pulou em direção do inimigo, foi
prontamente chutado para perto do filhote de dragão aprisionado. Não era o
filho de um dragão, era um demônio possuindo o corpo daquele hibrido.
Halphy então pulou com força na direção das costas do
oponente. Apesar de não ter sido um golpe fatal, o inimigo enfraqueceu. Isso se
devia ao poder da lâmina da jovem assassina. Sombras, como serpentes, partiam
da ponta da lâmina até a ferida criada por ela. Mesmo estando distante do
corpo. Ela sugava parte da vida da criatura, ou melhor, de sua alma.
-Mas o que isso? – questionou ele com a mão na ferida, que
tremia de dor.
-Acho que você não conhece o aço cruel de minha Vampira de
Almas? Ela não precisa ser exata, só ferir o inimigo.
O oponente, muito inteligente e extremamente ágil, pula para
trás da ladina. Agora, ele poderia se concentrar em todos os ataques. Viessem
dos arcanos dos guerreiros. Ele era muito veloz, devido ao fato de não usar uma
armadura.
-Tome isso! – pronunciou Arctus - Il buio della sua anima
occhi occultato! Ora!
Um novo raio surgiu no ar. Mas a conseqüência dele no corpo
do hibrido foi plenamente visto. Os olhos reptilianos da criatura ficaram
escuros como a noite de uma lua nova. Ele estava cego.
-Ora, ora. Os ratinhos humanos querem brincar de gente
grande.
Ele falava isso com arrogância. Nem parecia que ele estava em
desvantagem. O número superior de oponentes, a ferida terrível e a visão
perdida não lhe assustavam. Ele sabia que se matasse o conjurador, a magia não
cessaria, mas era algo que devia ignorar. Era o desafio que realmente
importava.
Seton atacou, seguido de Thror com sua veloz espada curta. A
enorme foice deixava o golpe do druida, muito lento. E mesmo a lâmina mágica e
rápida como o vento do grego, não conseguiu atingir o corpo do marduk. Deveria
ter deuses poderosos para quem aquele monstro deveria rezar, pensava o homem da
cicatriz.
Os golpes continuavam, sendo que boa parte deles não afetavam
sua pele rígida como metal. Eram feridas que incapacitariam pessoas comuns, mas
a criatura não se abatia. Ela concedia um novo sentido a palavra inumano. Seus
olhos, mesmo estando completamente escuros, pareciam trazer consigo medo para
quem o fitava. Parecia enlouquecido, tal qual um ser sem mente ou coração. Tal
qual um dragão de verdade.
Era grande, mesmo para os padrões desses seres. Talvez se
devesse a sua herança de sangue. Além de seus traços de dragão, seus cabelos
loiros demonstravam uma herança germânica. Era um espécime raro.
Havia momentos em que parecia estarem atacando uma parede.
Foice, espada curta ou longa, maça e adaga foram usadas, mas nada adiantou. Os
ataques de nada serviam. Pareciam pequenas pancadas de mãos nuas não treinadas.
Os cortes eram sempre superficiais, quase sempre no ombro ou próximo do peito
no máximo.
Nas lâminas dos Dragões da Justiça, havia muito mais marcas
do que daquele poderoso ser. As armas comuns não agüentariam muito. Os golpes,
mesmo de Thror, diminuíam sua eficácia. As magias sumiam das memórias do mago,
do druida, do padre e da feiticeira. Não haviam enfrentado combatentes tão
formidáveis até então.
Os guerreiros anões que serviam a Mallmor, a prole de Argos,
o lobo Cícero, a múmia élfica e os homens lagarto lá fora, nunca tinham sido
tão desafiadores quanto o oponente na frente deles.
Então Gustavo criou um plano ousado.
-Thror, corra até ele e desfira um golpe. Estarei te
protegendo! Tenho uma idéia!
-Certo. Mas é bom isso funcionar!
-Tem de funcionar.
Quase como dois animais preparados para o bote, Thror e
Gustavo partiram na direção do inimigo. O guerreiro com a cicatriz na cabeça se
jogou com o escudo na frente do meio dragão, este por sua vez, retirou o objeto
com um golpe de sua espada curta. Com esse ataque, Thror caiu para o lado. E
então, o paladino colocou o braço para trás, próximo do corpo do ser escarlate.
Girou a espada e tentou acertar. Mas com a mão vazia, a imensa criatura hibrida
quebrou o pulso do guerreiro sagrado.
-O que foi homenzinho? – falou o meio dragão – Desistiu de
viver?
Seton segura a foice com apreensão. Lacktum e Halphy pensavam
que não conseguiriam acertar o monstro sem atingir Gustavo. Era uma situação
perigosa. Mas algo de estranho ocorria. O paladino sorria.
-Você sabia que sei lutar tão bem com a lâmina, quanto com
meu escudo? – e enquanto proferia aquelas palavras, usou o item que permanecia
em seu outro braço como uma arma acertando a cabeça inimiga. O golpe preciso o desorientou
mais já que estava visão.
-Agora Arctus! – pediu o paladino.
A maça girou, o golpe do padre deixou tonto aquele oponente.
Lacktum saltou com a adaga sobre ele. Finalmente, haviam derrotado o marduk.
O mago havia pedido que os animais não participassem do
combate. Obviamente, só Valente não acatou essa ordem. Em compensação, sua
intromissão o fez ficar perto do dragão dourado filhote.
Ele possuía dois chifres lisos que se curvavam, se projetando
do supercílio. Suas pequenas e frágeis asas, que se estendiam por todo o corpo.
E suas costas pareciam com escamas feitas de ouro polido. Surgiam no corpo da
criatura manchas douradas e metálicas devido ao brilho do fogo na caverna.
Normalmente, os poderosos dragões de tom dourado eram
conhecidos por serem sábios quase sempre consultados nos piores momentos. E
seus filhotes seriam tão inteligentes, que conseguiam falar vários idiomas,
mesmo possuindo pouca idade. Naqueles momentos, todos perceberam essa
qualidade.
Enquanto o pequeno suricate fazia carinho nas escamas do
dragão, o prisioneiro falou:
-Obrigado criaturas. Nunca saberei como agradecer plenamente
vocês.
-Não é necessário isso – falou o mago com extrema delicadeza,
mas com certo receio – Mas o que houve para estar aqui filhote? Qual o seu nome
e onde estão seu pai e mãe? – ao perguntar isso, Lacktum pensou que realmente
não queria conhecer os pais do pequeno dragão. Conhecidos como os mais antigos
seres na face de Gaya, dragões tem o habito de queimar primeiro, perguntar
depois. Mesmo se tratando dos salvadores do filhote.
-Meus pais estão mortos – disse tristemente em resposta –
Nasci através de magias implantadas no ovo que estava. Foi assim que choquei.
Todos os dragões nascem de ovos. Mas eles não precisam nascer
com o calor dos pais como as aves, ou da crueldade fria das serpentes. Eles
necessitam do poder arcano de seus pais. Alguns magos, através de rituais
apropriados, conseguem despertar essas feras, encontrando seus antigos ovos.
Eram raros, mas existiam alguns sem chocar no mundo.
As lendas sobre estes seres mitológicos falavam sobre uma
grande assembléia que reuniu os mais poderosos entre eles. Não se sabe do que
se tratava, nem do que foi falado aconteceu um dos maiores fatos das histórias
antigas, citadas só por arcanas e criaturas mágicas: o êxodo dos dragões do
mundo conhecido.
Alguns acreditavam que seria melhor permanecer em Gaya. Quase
sempre, jovens ou loucos corajosos, o que explicava sua permanência naquele
lugar. O que muitos não sabiam nos anos antes do nascimento de Cristo, é que
muitos depositaram ovos escondidos nos mais diversos reinos ou cavernas.
Com certeza, o filhote deveria ser um deles.
-O que queriam com você? – perguntou Halphy passando as mãos
nas escamas. Não era por um motivo afetuoso, mas sim, devido a admiração que
tinha pelo jovem dragão.
-Eu não sei, mas sei que colocaram uma marca atrás de meu
pescoço. Usaram fogo arcano para isso.
Foi quando notaram um símbolo.
Lembrava a cabeça estilizada de um dragão. Só ao tocar,
Lacktum sentiu uma poderosa aura arcana emanando dela. Halphy, Arctus e Seton
também. O mana é uma energia poderosa.
A energia não é definida como qualquer outra coisa. Ela não é
chamada como o poder masculino ou feminino. Ela provém de todos os lugares,
seres ou objetos. Fosse para o bem ou o mal.
O poder dentro das correntes impedia o movimento do filhote.
E Lacktum ainda não poderia fazer nada por enquanto.
-Espere aqui, depois iremos te libertar – disse a ele.
-Não irei a lugar nenhum – disse a fera.
Lacktum criticou a si mesmo pela frase tola que acabará de
soltar.
-Compreenda que não temos poder para quebrar isso, mas logo o
teremos.
-Acredito em você;
Halphy então chamou o mago para perto do estandarte.
-Olhe Lacktum, uma passagem secreta.
Atrás do tecido, havia um buraco grande o bastante para
homens curvados passarem. Era visível uma luz no final dele. Novamente, a
herança élfica falava alto em Brown.
-Um túnel! Que cômodo – falou irônico o mago.
-Vamos ver para onde ele pode nos levar? – perguntou a jovem
Halphy.
-Bem temos que averiguar todo o lugar – respondeu Lacktum
enquanto notava se era segura a passagem para passar – E não possuímos um mapa
do local.
-Mesmo porque necessitamos de itens arcanos – falou um
ambicioso Seton.
Olhares furiosos apontaram para o druida que usava a foice enorme.
Havia muito mais ali do que a conquista de itens.
-Nós somos os Dragões da Justiça. Não os Dragões Atrás de
Itens Poderosos – inquiriu Halphy.
-Esta bem. Perdão.
-Vamos – ordenou o líder Lacktum.
Andavam abaixados, com cuidado. Thror e Gustavo tomavam a
frente. Os outros preparavam suas especificas magias. Até mesmo Halphy, que não
fazia tanto tempo que mexia com essas forças, parecia compreender bem aquelas
energias.
Atravessando o misterioso túnel, eles alcançaram sua ponta
iluminada.
Havia no lugar um quarto grande e amplo. Bem iluminado graças
a uma fonte de magia no teto daquela caverna. Também surgia muita iluminação
ali devido à grande concentração de esmeraldas. Até que enfim encontraram as
famosas pedras que concediam o nome a essa região.
De qualquer modo isso não era tudo. E eles iriam preferir que
fosse.
Era possível ver dois altares, onde parecia que haviam
depositado mortos. As estruturas eram de pedra, recentemente construídas por
mãos fortes. Já os corpos, estavam cobertos por uma mortalha com símbolos
arcanos nórdicos. Pelo que Seton notou, serviam para conservar a carne dos
mortos. Assim seria possível ainda ver a face do falecido, mesmo que anos se
passassem. Era um ritual antigo e poderoso de alguns sacerdotes que acreditavam
no Pai de Todos, Odin.
Havia véus cobrindo o rosto dos dois corpos. O medo de
alguns, era um ataque dos falecidos. No entanto, mesmo com a chance de um
ataque dos mortos famintos, Halphy e Lacktum tiraram os panos do que pareciam
ser os rostos.
Quando retiraram eles, viram rostos do passado.
Lacktum notou que em cima daquele altar havia um homem
aparentemente forte. Seu rosto era marcado por feridas. Era também marcado na
pele pelo sol. Cabelos negros brotavam de sua cabeça. Era um paladino que
conheciam bem. O mago tremeu ao falar:
-Ah Gustavo... Creio que este corpo...
O jovem paladino de Deus passou pelo quarto até alcançar seu
intento. Um irmão reconhece o outro. Especialmente quando se amam.
-Federick... Meu irmão... Como te deixei partir? Oh Céus, me
perdoem! Não acredito nisso! Você era umas das pessoas que mais amava nesse
mundo... E agora?
As lágrimas corriam dos olhos de Gustavo. Cada gota parecia
uma cachoeira. Pareciam que tinham sido represadas dentro do coração do jovem
príncipe. Mas agora transbordavam com os sentimentos. Era o amor entre irmão.
Seton que olhava o guerreiro sagrado, deitado sobre o corpo
do irmão, tocou o ombro do mago. Era triste ver seu colega naquele estado.
-Que Deus lhe guie – Arctus falou em reseito.
-Pobre Federick... - começou a dizer para si mesmo Gustavo,
mas desistiu.
Thror se calou como se fosse parcialmente culpado por aquilo.
E não importasse o quanto qualquer um falasse sempre se sentiria. Mas quando
tudo parecia triste o suficiente em seus corações, Halphy pronunciou:
-Lacktum... Acho que é quem você buscava. Não é?
Seus pés ficaram. Nunca antes a vontade daquele jovem brigou
com a razão de forma tão ferrenha. Era nova aquela sensação. Ele sempre lutou
para tentar encontrar seu amor, mas sempre quis que estivesse errado. Que ela
tivesse - talvez – em fuga ou que estivesse com outro, que entregou sua alma a
um demônio, que estivesse sendo mantida refém, mas que estivesse viva. Pois a
morte era algo que ele não conseguiria vencer.
Lacktum fitou o rosto da jovem Lirah.
-Como eu queria ter perdido a visão. Cubra o rosto dela.
Ninguém falou nada ou reagiu, com exceção de Gustavo, que
ainda soluçava. Nem o mago se deixava expressar quaisquer emoções. De qualquer
modo, ele sabia que isso era difícil. Queria abraçar o corpo dela, sentir seu
cheiro, fosse bom ou ruim. Tocar seus cabelos como se fosse algo belo e
confortável. E o era para Lacktum. Mas ele já não era mais só um jovem nobre e
apaixonado. Agora era o líder dos Dragões da Justiça e sua meta era clara.
-Eu tenho que sair – disse isso, enquanto passava pelo túnel
que os trouxera até ali.
Halphy segurava seu próprio braço esquerdo com força,
enquanto via seu amigo sair daquele quarto. Parecia angustiada por não poder
fazer nada pelo colega.
Voltou até a sala onde estava o dragão dourado filhote. Lá
ficou em silêncio com Alexander, que veio depois, lhe fazendo companhia.
Normalmente, o cão falaria algumas palavras de confiança, mas
aquilo não era nada com o que estivesse acostumado. E mesmo que o estivesse não
seria fácil lidar... Nunca. Ele só agiu como todo companheiro fiel. Deitou-se
ao lado de Lacktum, que havia sentado em um canto do salão. O arcano acariciou
o animal como se aquilo lhe trouxesse paz.
Tempos depois, quando o jovem inglês se preparava para levantar,
ouviu passos do túnel. Era Arctus surgindo por de trás do estandarte.
-Lacktum! Preciso falar com você!
-O que foi homem?
-Continuamos vasculhando aquele lugar e encontramos algumas
coisas. Moedas e um item mágico que fornece asas. Mas não é por isso que estou
aqui.
-Então?
-Encontramos dois pergaminhos... Um deles endereçado a você.
-Será que... – disse o mago pensativo.
-O que foi? – perguntou o padre.
-Quando estávamos em Starten, no começo de nossas viagens...
Havia uma igreja e depois de um duro combate, lá dentro se encontrava uma
mensagem do homem mascarado que sempre cacei. Na época não sabia que se tratava
de Kalic Benton II. Além de ver uma cena bizarra naquele lugar também... Não
importa! Mas isso me deixa receoso.
O missionário olhou diretamente para os olhos de seu líder.
Nesse momento, tirou de suas vestes o pergaminho.
-Leia.
Antes não tivesse lido.
Vejo que controla um grupo até que grande de formigas,
como você. Homens sem memórias, príncipes sem reinos e espíritos cinzas.
Mas essa mensagem não esta aqui só para lhe atormentar.
Esta aqui para lhe conceder a chave que tanto procura. Mais do que a vingança.
Junto dessa mensagem, há outro pergaminho. Com magia
antiga e poderosa para reviver os mortos. Isso mesmo você tem a chance de
ressuscitar um deles. Quem será?
Atenciosamente, Kalic
Benton II
Logo em seguida, o mago de cabelos cor de fogo olha para a
mão de seu colega que estendeu aquele pergaminho até ele. E as palavras que ele
pronunciou ecoariam em sua mente enquanto estivesse vivo.
-Pegue o pergaminho e o use em Federick.
-Mas Lacktum...
-Eu sei o que estou falando! Faça!
O sacerdote se entristeceu com a atitude do mago, mas a
entendeu. Era duro e pesado o cargo de líder, pensou ele.
Arctus preparava o pergaminho. Ele possuía força para a
tentativa do clérigo ressuscitar o irmão de Gustavo. Mas não conseguia deixar
de olhar para a amada do mago.
Então ele começou a recitar o pergaminho. O ritual estava
para começar.
As mãos de Arctus estavam sobre a cabeça de Federick. O
pergaminho estava em cima do corpo brilhando com uma aura divina. Uma aura de
paz se instaurou em todos os membros dos Dragões da Justiça. Mesmo os mais
confusos.
Tudo que surgia no coração do padre criava no lugar uma
sensação de conforto. Era quase palpável. Como anjos que amparam as almas
aflitas e perdidas. Fosse lá quem estivesse naquele quarto notou a força que
era inerente no rapaz. Era único.
-Como disse o filho Dele: eu sou a ressurreição e a vida.
Aquele que crê em mim, ainda que esteja morto, viverá. E todo aquele que vive e
crê em mim, jamais morrerá. Pai rendo-te graças, porque me ouviste. Eu bem sei
que me ouviste. Eu bem sei que sempre me ouves, mas falo assim por causa
daqueles que creiam que tu me enviaste. Por isso eu clamo Federick, levanta! –
disse Arctus.
Com isso uma luz forte irradiada do corpo de Federick começou
a tocar o lugar com energia benevolente. Uma força descomunal. Isso, poréms só
durou alguns instantes.
Foi possível ver um estranho movimento surgindo na barriga de
Federick. Muitos imaginaram que talvez fosse pelo fato do jovem estar prestes
mesmo a ressuscitar, mas logo notariam que não era. O corpo começou a se
contorcer, como se fosse despertar. Seus olhos até mesmo abriram. Mas as
reações do antigo paladino seriam as suas últimas.
Sem nenhum aviso, do antigo amigo tombado, se abriu uma
enorme ferida saindo do ventre. Era como o golpe de um animal. Começaram então
a surgir vermes bizarros e podres do corpo. Cada um maior e mais asqueroso do
que o outro. Por cima um do outro, criando um monte grande o bastante para
tomar todo o cadáver. Tanto que eles partiram ao meio, devorando os restos
mortais. A cintura e a barriga sumiram do lugar quase que por magia. Magia
negra.
-Meu irmão! Não! – tentou gritar Gustavo, enquanto ia à
direção do corpo. Foi interrompido pelo grego. Era triste ainda mais para
Thror, perder o amigo, duas vezes.
-Lacktum! – gritou uma desesperada Halphy – Venha aqui!
Tempos depois, o mago surgiu pelo túnel. Foi quando ele se
questionou que pandemônio era esse.
-Mago! – soltou um furioso paladino contra o arcano – Você
quis ressuscitar meu irmão, pois já sabia o que iria acontecer, não é?
-Eu não sei do que fala paladino! E me largue!
Contra a própria vontade, o paladino largou o aliado
recobrando parte de sua consciência. O que mostrava que sua fúria ainda não foi
aplacada. Lacktum então se situou do que realmente ocorria. O plano então
surgiu em sua cabeça. Ele caminhou até o corpo – ou que restou – de Federick,
para ter certeza.
Tocou em um dos vermes.
-Vermes de Hel! - pronunciou o mago.
-Calma Lacktum – disse Halphy – Sei que esta triste, mas...
-Não Halphy! Isso aqui é uma magia chamada, vermes de Hel.
Magia antiga dos povos do norte. Poucos usam, pois só alguns conhecem esse tipo
de magia. É como a magia negra dos nossos costumes.
-Fale isso pelo seu povo ruivo – falou o clérigo Arctus e
então continuou – Então significa que essa magia estava preparada no corpo do
irmão de Gustavo? Quem o faria?
-A mesma pessoa que nos fez chegar até aqui através de um
campo de batalha caótico. Talvez até mesmo com um pedido de Diogo Fernandez.
Mas pelo que entendi só pode ter sido... Kalic Benton II. E acredito até que
ele implantou essa magia no corpo de Lirah.
Todos tinham olhos tensos e nervosos. Era como se sentir
extremamente bem e toda a desgraça do mundo cair em seus ombros logo em
seguida. Para alguns ali, seria ter o companheiro de volta, para o irmão, seria
um modo de apagar seus pecados. Mas acima de tudo, para Lacktum, significava
que uma vez mais sentiria estar um passo atrás do mago mascarado.
Teriam que continuar o caminho até o dragão Daehim. Halphy e
Arctus só esperavam o líder se levantar e ir à direção do grupo, que já tinha
deixado aquele quarto. Mesmo a contragosto, Gustavo deixou os restos mortais de
seu irmão naquele lugar. De nada iria adiantar levar com ele os vestígios de
Federick. Assim, possuindo só três pessoas naquele lugar, houve um momento em
que o jovem inglês de cabelos vermelhos ficou a sós com o corpo de Lirah.
Ele chegou próximo de sua amada. Continuava como era no dia
em que a conheceu. Sua tez branca como neve, com seus olhos fechados, mas que
ele sabia serem verdes. A mortalha cobria as mãos marcadas por espinhos que
apareciam quando colhiam flores do campo. Que ainda assim, eram tão doces
quando se tratava de carinho. Quantas memórias não surgiram na mente do rapaz,
quantas sensações não voltavam como relâmpagos em uma planície. E o que
importava? Ela estava morta e nada mais fazia sentido. A verdade é que ele
desejava ter tudo àquilo de volta. Talvez como em um passo de mágicas. Isso era
estranho, mas sua vontade de se tornar o mestre do destino não fosse só mera
vingança afinal. E sim tivesse mais nexo com alterar as tramas do destino.
Mas nada seria feito naquele momento.
Com a mão no rosto de sua amada, ele se despede beijando sua
testa.
-Quando terminaremos tudo, voltaremos para te levar. E lhe
enterrar como é necessário e certo. Enquanto isso agüente do outro lado, esta
bem meu amor? Guarde nosso lugar ao Céu, esta bem?
Falando isso, ele finalmente saiu daquele quarto. Os vermes
de Hel estavam mortos e então cobriram o que restou do corpo de Federick. Era
certo que voltariam. Pois os Dragões da Justiça eram sua obrigação agora, mas
ele também amava Lirah.
Ele caminhava com passos pesados
O grupo inteiro esperava do lado de fora. Muitos tentavam
entender o que era aquele símbolo no dragão. Outros, só pensavam no que fariam
dali em diante. E quando todos menos imaginavam, foi que o mago surgiu por de
trás do estandarte.
-Vamos Dragões! – ordenou arrogante como de costume o jovem –
Estão achando que estamos aqui para conversinhas?
Todos estavam atentos. Pelo que sabiam, havia prisioneiros
nas cavernas, fato reforçado pelo filhote de dragão dourado. Ele disse ouvir
gritos de homens e mulheres na direção de um dos túneis. Era para lá que os
aventureiros se dirigiriam.
Como toda a caverna até agora, era irregular aquele caminho.
Mas nada que eles não conseguissem contornar.
Em determinado ponto, era possível ver e ouvir os
prisioneiros. Conversavam e falavam alto na língua comum da região. Os Dragões
encontraram os prisioneiros.
-Todos
estão bem? – falava Halphy, diante de uma prisão feita toda de madeira. Era bem
feita e forte.
As
pessoas lá dentro estavam desnutridas. Eram claras as faces com fome e sede.
Crianças, velhos, mulheres e homens. Todas pareciam derrotadas, sem esperanças
e sem futuro. Como se o dragão drenasse tudo daqueles que estavam ali.
Foi com um golpe de espada, que a esperança nos rostos
voltou. O paladino soltou uma frase, resoluto:
-O controle do dragão sob o Vale das Esmeraldas terminará
hoje. Celebrem meus amigos.
Surgiram nos antigos rostos tristes, pequenos esboços de
sorrisos. Era como se o jovem Gustavo conseguisse irradiar parte de sua fé aos
descrentes.
-Que coisa meu caro paladino – pronunciava sarcasticamente o
druida Seton – Não era você que ia contra os pagãos? Agora vem os salvar?
-A salvação se dá, não através do corpo, mas sim pela alma.
Toda a alma merece redenção. Cristo esta em todo o lugar.
-Levante uma pedra e me encontrará. Corte uma árvore e me
achará.
Muitos olharam com espanto. Pensaram que essa frase viria de
Arctus ou de Gustavo, mas não. Surgiu da boca de Lacktum.
-Como você falou algo assim? – espantada disse a ladina
feiticeira – Pareceu algo do Livro Sagrado. Por acaso é?
Lacktum sorriu.
-Meus pais respeitavam todas as tradições e religiões. Mas
nunca se definiram por uma. Já a família de Lirah era muito cristã. Sempre
achei isso uma coisa inútil, mas ela me fez decorar esse trecho. É de um
evangelho.
Arctus então se espantou com as palavras de Lacktum.
-Mas meu caro – começou o padre – esse trecho não esta
escrito na Bíblia. Não sei onde Lirah ouviu isso, mas não é algo referente à
nossa fé.
-Foi Lugar ao’Céu quem me contou isso. E acredito no que ela me
falou.
Não sabiam se era algum modo do mago irritar o padre, mesmo
assim era pouco provável. Já que a pouco encontrou sua amada. Depois de tudo
que passará, seria difícil dele tentar algo de mau gosto tão cedo.
Todos os prisioneiros tiveram novos ânimos depois das
palavras de Gustavo. Esconderam-se em um dos cantos do covil e sairiam após as
ordens do grupo. Antes disso, eles falaram qual dos túneis levava ao temível
dragão, Daehim.
Os membros do grupo subiam um túnel mais bem trabalhado do
que os outros pelos quais passaram antes. Alexander servia de guia na
escuridão, já que a luz de suas tochas já se extinguiu. E pelo que o cão
sentia, mais ao fundo fedia a enxofre o lugar.
Há lendas que independente do dragão ou de sua espécie, o
cheiro dessa substância era inerente em todas elas. Mesmo quando o elemento do
dragão nada tinha haver com fogo, aquele odor se tornava presente. Na verdade,
nem era mais necessária a ajuda do cão para isso.
-Cheiro forte! – exclamou o guerreiro Thror – Será que o
dragão cheira tão mal?
-Se cheira, já sei qual sua principal arma! – soltou em
resposta Seton.
-Calados os dois! – mandou Lacktum – Vejam.
Surgiu diante dos olhos de todo o grupo um enorme e pesado
portão de aço com o símbolo que foi fixado no corpo do filhote de dragão
dourado. Parecia ter sido construído recentemente. Com certeza, foi feito
através de magia.
Os jovens, Halphy, Lacktum, Thror, Seton, Arctus e Gustavo, e
os animais, Rec, Fiel, Alexander e Furta Trufas, se sentiam intimidados com
aquela imagem na sua frente. Era como se estivessem para abrir as portas de um
mundo desconhecido até então. O mago ordenou.
-Thror! Abra isso agora!
Então o grego chutou com toda a força que tinha contra o
maciço de ferro. A estrutura então se abriu rapidamente, mesmo sendo tão
pesada.
O cheiro de enxofre subiu. Forte como se adentrassem as
portas do Inferno. E a atmosfera do lugar reforçava essa impressão de força
demoníaca. Como se quisesse tirar a coragem dos jovens. Mas não se abalariam
com um fedor. Quem sabe, não fossem temer mais então, aquele que exalava esse
cheiro?
Andaram até um salão que continha vários cristais de cor
verde radiante que atingiam todos os cantos. Aquele lugar não era tão claro
mesmo assim. Pequenos raios de sol vinham do teto deixando o lugar razoavelmente
iluminado. Havia uma escada de pedra que parecia chegar até a saída dos raios.
De qualquer jeito, o lugar nas partes baixas continuava escuro.
Todos estavam com suas armas apontadas. Seja lá o que fosse
que estivesse nas sombras, eles estariam preparados. Mesmo que isso custasse
suas vidas.
-Acho que esse é o momento para vermos se os Dragões... –
começou Lacktum.
-São páreo para um dragão de verdade? – completou a jovem
ladina com sua face sarcástica – Não era isso que iria falar? Imaginei que seria.
-Você consegue me irritar...
-Ora, ora, - disse uma voz nas sombras – formigas não
deveriam brincar de dragões, assim como homens não deveriam brincar de deuses.
Aquela frase. Era algo que Lacktum estava notando parecer
provir do terrível mago mascarado. Mas nem o brinco, nem a adaga brilharam
então ele não estava ali. Porém, o tom na voz do desconecido parecia saber do
que se tratava. Como se fosse uma provocação.
Das sombras começou a surgir uma forma humanóide. Ele tinha o
tom de pele de um elfo negro. Elfos negros são de pele clara, como os sidhe,
quando nascem. Porém, quando crescem, sua tez é atingida por manchas negras que
um dia cobrem todo o corpo. Esse elfo tinha todo o corpo coberto, incluindo sua
face.
Possuía uma série de mantos negros e marrons. Suas mãos eram
cobertas com manoplas de aço prateada, parecidas com as garras de um dragão.
Também usava um medalhão da mesma cor. Os olhos dele eram cheios de uma fúria
draconiana. Seus cabelos tinham um tom escuro e sombrio, longos como os pelos de
um animal.
Ele pronunciava as palavras com a voz baixa:
-Então vejo que as formigas de mestre Kalic Benton chegram
longe. Bem, estamos aqui para lhes recepcionar como nos foi mandado. Sejam...
Seria falso disser bem vindos.
-Quem é você sidhe sombrio[1]?
-Olhem! – observou Halphy com visão sagaz.
O corpo do elfo negro envergou. Colocou-se todo para frente,
como se fosse assumir uma posição quadrúpede. As pernas aumentaram
gradativamente de tamanho. Os braços e mãos esticaram de forma a criar garras.
Criavam patas dianteiras e traseiras escamadas. Suas forças e poderes
aumentaram drasticamente, isso era claro para os arcanos e clérigos que sentiam
isso em seus espíritos. O peito do desconhecido convulsionou até estourar a
pele. Dos farrapos daquelas costas, brotaram duas asas enormes, coriáceas e
cheias de nervuras. Por último, seu pescoço esticou deformando o pequeno rosto
élfico. Eram mais claras as diminutas lâminas que protegiam o corpo dele,
lembrando vagamente uma serpente protegiam o corpo dele, lembrando vagamente
uma serpente negra. As roupas haviam sumido como que por encanto.
Alexander rangia os dentes, Valente respirava fundo, enquanto
Furta Trufas soltava todo o tipo de prece a qualquer divindade que o escutasse.
Enquanto isso, os Dragões preparavam seus respectivos armamentos e poderes. De
qualquer modo, os jovens sentiam que havia mais oponentes naquele lugar. E
estavam certos.
Surgiram das sombras, dois marduks de cor escura. Um deles
carregava uma enorme corrente que girava no ar, criando um som que parecia um
assobio. Já o outro portava uma grande maça de guerra. Não usavam armaduras,
mas aparentemente não precisavam. Suas peles possuíam algumas escamas e seus
rostos lembravam plenamente um dragão.
Todos no grupo se mantinham firmes, mas não sabiam como
reagir.
O dragão levantou o pescoço de forma imponente. Seus olhos
mostravam o completo desprezo pelos seres a sua frente. Um de encarando um
bando de formigas. Agora entendiam a metáfora que sempre usavam para eles.
-Muito bem humanos, se procuravam um dragão que seja. Aqui
esta. Daehim, o líder dos dragões aliados a Kalic Benton, eu sou a Sombra
Gélida.
Lacktum tremia. Era como se encontrasse o ser mais onipotente
que já viu em sua curta vida. E na verdade era. Alguns falam sobre a
resistência dos dragões, sobre seus poderes arcanos, da força em combate, mas
que todos temiam era a mera presença de um dragão.
O medo voltou ao coração do jovem Van Kristen. Como daquela
vez a mais de dois anos atrás. Imóvel e sem voz. Sem poder de alterar algo novamente
como na cena da morte dos pais e de sua irmã. E de Lirah. A mesma ao qual
encontrará antes na caverna como um cadáver. Foi-lhe tirado tudo. Inclusive o
amor... E a coragem. A vingança já não era o suficiente.
Enquanto isso, os outros aventureiros olhavam para o mago.
Esperava-se dele um grito, uma blasfêmia, uma provocação, mas nada parecia
tirar o jovem do seu transe mental. O medo superava a ira do jovem.
Passos de uma greva do mais puro metal se escutava.
Gustavo caminhou na direção do monstro. Sua armadura refletia
pouca luz, mas naquele instante parecia iluminar o lugar.
-Deus esta conosco. Então quem será contra nós? Eu sempre
lutei o bom combate. Mas sei que minha morte esta predestinada. Nem por isso
estremeço ou temo o mal que esta na minha frente. Minha vida é guiada por
palavras cheias de maldição e sofrimento. Elas falaram que morrerei pelas mãos
de quem mais amo. E assim será! Só achei que uma pessoa que crê em Odin traria
mais do que palavras ao campo de batalha. Ele agiria.
Lacktum sabia o que Gustavo queria. Há muito tempo o arcano
não empunhava o cetro. O símbolo de um mago estava agora em sua mão e ele o
fitava depois de tanto tempo.
O item foi fabricado por Thror do metal místico dos anões.
Azerov havia cedido a eles para a fabricação de itens. O ditado dizia que seria
sempre melhor retirar um cajado de um arcano, pois com ele poderiam ser feitas
façanhas. Havia o momento de provar isso.
-Cale a boca Gustavo! – disse o mago irritado.
Gustavo riu.
-Eu sou um dos Dragões da Justiça. E o meu som ecoará pela
eternidade.
Só então Lacktum reagiu.
-Esta bem meu caro guerreiro sagrado. Você me convenceu.
Dragões me sigam!
Nesse momento, foi como se uma chama reacendesse no coração
daquele jovem. O ódio e a vingança foram tragados. Só sobrou a vontade de lutar
e enfrentar todo e qualquer mal que surgisse na frente dele. O Van Kristen
estava de volta ao controle.
O dragão riu com ar de escárnio daquela peça ridícula.
O combate se iniciava. Thror e Gustavo foram em direção dos
dois marduks. Enquanto isso, o resto do grupo para cima de Daehim.
A lâmina do guerreiro grego brilhava contra a corrente de
metal negro. Eram como pequenas estrelas nascendo a cada golpe. Só que no
terceiro golpe o marduk de cor negra conseguiu arrancar a arma de Thror. Ela
caiu longe.
-Praga!
-O que foi humano? Teme a corrente de Marduk?
-Nunca! Espere, você é um marduk que se chama Marduk?
E ignorando a pergunta disse:
-Pois devia...
E nesse momento, a arma do meio dragão se enrolou no braço de
Thror. Este se manteve firme mesmo com o terrível golpe de seu inimigo
dracônico. Ainda assim era visível a dor no rosto marcado do homem com a
cicatriz. Seu braço talvez não resistisse muito.
Já Gustavo mantinha o ritmo do combate. Só que em determinado
momento, a maça acertou atrás do joelho do paladino. E isso o forçou a se
ajoelhar. Mesmo assim, ele usou a espada para se apoiar.
Os cabelos negros do paladino pareciam esconder sua dor
física. Seu olhar cheio de fúria mostrava que a dor era profunda.
-O que foi paladino? A dor esta demais? – enquanto falava
isso, o hibrido se aproximava do guerreiro – Teme a arma de Tiamat?
-Não sei o que é medo. Só sei que Deus guia minha lâmina.
Guia meus passos. E guia meus ataques. Amém!
Quando isso foi dito, golpe de Salles foi certeiro. A espada
brilhou no momento em que tocou as escamas no corpo do inimigo. Ela atravessou
o ombro, quase trespassando completamente.
Mesmo assim o guerreiro de pele escamosa não esboçava nenhuma
dor. Pelo menos nenhum sinal aparente. Era realmente um fato surpreendente.
O dragão olhava para o resto do grupo com desdém. Os animais
haviam se escondido por ordem de Lacktum. Além do mago, a criatura enorme
estava cercada por Arctus, Seton e Halphy. Isso não o amedrontava. Estava claro
em seu semblante.
De sua bocarra um estranho movimento surgia. Primeiro, na
verdade, ele começou no peito. Como um brilho escuro e fraco. Foi subindo pelo
pescoço até chegar à altura das presas. E quando isso ocorreu, surgiu no
espírito de Lacktum e Halphy um temor.
-Todos saltem o mais distante do dragão! Ele irá soltar o
sopro!
Era tarde demais.
A criatura vomitou um sopro de chamas negras. Pareciam quase
invisíveis na escuridão do local. Mas mesmo assim, parecia um tufão gigantesco
de chamas que causava um barulho ensurdecedor. Seria magnífico, se não fosse
aterrador. Esta como uma poderosa força sombria da natureza. Não era a toa que
alguns falavam que os dragões das trevas eram descendentes de Ndhoggr, o
poderoso dragão que devorava Yggdrasil. O seu mal superou as eras. E criava todo
aquele fenômeno poderoso em cima dos aventureiros.
Gustavo e Thror – já que o poder de sopro não os alcançou - não
foram pegos pelo jato de fogo negro, diferente de seus adversários marduks.
Estes foram completamente tragados pelo jato. Halphy e Arctus escaparam da
torrente de calor sombrio, mas esse último ainda foi atingido na perna. Lacktum
e Seton não tiveram a mesma sorte. O golpe tinha coberto os dois como um manto
profano de dor.
Quando cessou, estavam os dois no mesmo lugar. Porém, só
Lacktum estava de pé. Daehim riu.
-Arctus! – gritou o jovem líder dos dragões, apontando para
Seton – Cure o druida.
-Certo! – mesmo como dor o padre se moveu naquela direção.
-Acreditam mesmo que vencerão? – desafiou o dragão – Seus
dons foram o bastante para enfrentar as tropas de Mallmor. Mas nunca derrotarão
um dragão em plenos poderes. Somos mais do que uma tropa de soldados
maltrapilhos.
O mago ruivo riu freneticamente. Alguns do grupo pensaram que
ele tinha enlouquecido.
-Plenos poderes? Talvez, no máximo, você tenha alguns anos ou
séculos de vida. Estudei muito sobre sua raça, já que muitos livros arcanos são
escritos em sua língua. Não tente me ludibriar.
E com um passo que fazia o chão estremecer, o grande dragão
se moveu, perguntado:
-É mesmo mago? E o que mais aprendeu sobre nossa raça, mago?
-Que as espécies com sopro de chamas negras são fracas contra
fogo puro – nesse momento, o jovem ruivo pronunciava encantos, enquanto
armazenava mana em sua mão esquerda longe da vista do dragão - In my hands the
flame comes the Dragons of Justice. The renewing power of destruction.
Com uma mão estendida, ele fez surgir uma enorme esfera de
chamas. Era tão grande, mas mesmo assim só cobria metade do corpo da enorme
criatura. Pelo menos, seria o suficiente para machucar Sombra Gélida.
Havia feridas por todo o corpo de Daehim. Machucado ele
estava, mas ainda bem o suficiente para um combate.
Enquanto isso, Gustavo e Thror notaram espantados já que seus
respectivos adversários pareciam sequer possuir uma marca das chamas negras por
seus corpos. Só as feridas que eles causaram continuavam nos marduks negros. Os
dois começaram a se gabar.
-Estão com medo? Notaram que Tiamat e Marduk não levaram
nenhum dano? – disse o marduk que enfrentava Gustavo.
-Mas vão levar. Quod lamina, Foecunda ducem ad finem.
Nesse momento, o marduk saltou na direção de seu inimigo, o
paladino. E novamente, um brilho se fez surgir. Era o fio da espada do
paladino, com toda a força do Divino. Só que ao mesmo tempo, o meio dragão de
nome Tiamat, acertou seu cotovelo de forma a incapacitar o braço de Gustavo. A
dor era dilacerante.
Era possível ver que o aço de Salles atravessava a pele do
adversário, enquanto braço que segurava a arma estava completamente
incapacitado. Um golpe preciso o impossibilitou de segurar a espada. Os dois
estavam prestes a morre.
Quando do outro braço de Gustavo se levantou contra a cabeça
do híbrido, o escudo que usava. Só surgia da cabeça do inimigo um pequeno jato
de sangue.
Gustavo colocava a proteção como agora. Já que seu braço bom
estava completamente quebrado e inutilizado, ele precisou improvisar uma arma.
Ele olhou na direção de Thror enquanto Marduk gritava:
-Irmão Tiamat!
-Você é o próximo marduk maldito! Não desvie o olhar! –
gritou o grego mesmo desarmado.
-Que meigo. O líder do grupo mudou as palavras do
encantamento em homenagem aos amiguinhos. Que lindo – soltava um ainda
sarcástico dragão, que até agora não usou suas asas. Era estranho para alguns.
Ele era forte e cada golpe quase levava um dos membros do
grupo para o Além. Agora compreendiam a comparação com os anões na torre de
Azerov: eles eram em menor número e venceram. Mas a situação se inverteu, o
dragão ainda dominava o combate. Halphy tinha grande presteza e por isso
conseguia se esquivar de suas investidas. Já Arctus e Seton eram gravemente
feridos. Cada garra, presa e cauda era um novo ferimento, aplacado pela magia
de cura. Mas nem ela parecia suficiente.
-Lacktum! Estamos usando magias e nossos melhores golpes não
estão servindo para nada! – gritou Halphy inconformada.
-Já sei o que faremos – e nesse momento o mago fitou Arctus -
A espada padre!
Então, nesse momento, o clérigo sacou uma grande arma de seu
manto. Era uma lamina grande e imponente. Ela tinha runas na antiga língua dos
dragões e naquele momento, brilhava com a intensidade do sol. Talvez isso se
devesse ao fato de estar próxima de um dragão. Aquela era a lâmina que foi
entregue na Vila Meio Sangue.
O dragão, literalmente, arregalou seus olhos quando notou que
a espada era um dos itens poderosos criados para enfrentar seres de sua raça e
sua índole maligna. Daehim colocou o pescoço para trás, em um claro sinal de
temor.
-Silthar-Mor![2]
- soltou o dragão com ódio em sua voz – Como obtiveram Silthar-Mor? Uma das
três lâminas poderosas dos ossos de anciões de minha raça? Como pode?
-Não sei qual o motivo de dragões criarem armas, mas acho que
foi o destino – disse Lacktum feliz com o pavor na voz do inimigo – Arctus diz
que foi o Deus dele. Halphy pensa que foi pura sorte. Bem, pouco me importa.
-Você zomba de mim arcano?
-Eu não. Mas não posso dizer o mesmo de meus amigos. O que
diz Arctus?
-Eu digo isso... Le falangi di Dio sono pieni di potere
divino! Pronunciava o padre, enquanto evocava uma magia. Seu corpo foi tomado
por uma luz intensa de poder.
Logo
em seguida, o clérigo de Deus levantou a espada com as duas mãos. E correndo
até Daehim, que tentou inutilmente desferir nele um golpe, acertou um golpe
preciso na couraça do dragão. O ser urrou com a dor como não tinha feito até
agora.
-Pai! – gritou desesperado o marduk que combatia Thror. Isso
distraiu aquele ser tempo suficiente para o grego desferir um golpe de seu
poderoso punho. Não foi suficiente para atordoar Marduk. E pior, agora o punho
do guerreiro da cicatriz sangrava muito.
-Praga! Do que é feito essa pele desses monstros? – gritou
loucamente de dor o grego depois do soco.
-Meu pai não perecerá aqui. Mesmo porque se pegasse em uma
arma seria inútil guerreiro – disse o desafiante de Thror ainda confiante –
Vejo que sua mão esta inútil.
-Thror! Saia de perto dele! – falado isso, Gustavo golpeou o
rosto do marduk com força suficiente para machucar. Usando o seu escudo
novamente. Ele nem deve como pensar em pegar a espada.
O grego ficou ajoelhado de dor. Gustavo incentivou o amigo a
levantar.
-Acreditam que dois de vocês podem comigo? São loucos? –
falou Marduk furioso.
-Eu não acho... Eu tenho certeza!
-E sim somos loucos! – disse Thror, ainda sentindo dores no
punho.
Quando Marduk notou os dois membros dos Dragões da Justiça
estavam lado a lado. Com dificuldade, Thror se levantou, enquanto Gustavo
ajeitava o escudo corretamente no braço. Um olhou para o outro como se
planejassem a mesma coisa.
-Eu acho que tenho um plano. Você me acompanha nele? – o
paladino falou isso para o guerreiro.
-Tenho alternativa? - disse o guerreiro da cicatriz.
Enquanto os dois enfrentavam só um Marduk, o restante do
grupo confrontava o temível dragão. Seu aspecto era aterrorizante, mesmo tão
ferido. Sua alcunha de Sombra Gélida fazia jus.
-A espada esta adiantando Lacktum – gritou o padre – Mas
estou temendo que ele fuja!
Foi Halphy quem falou:
-Poder deixar amigo. Ele não vai fugir.
-É bom estar certa mulher.
Enquanto ouvia essa conversa, Daehim aproveitou e atacou o
mago que preparava sua magia. O golpe tinha deslocado o braço direito, além de
incapacitar a perna com a perna do mesmo lado. O jovem se irritava com a dor
causada pela garra do monstro.
-Praga! Praga! Praga! – gritava ele caído no chão.
-Tenha calma! – falava um Seton que havia se colocado na frente
do mago. Ele tremia. A foice nem sequer parecia firme em sua mão. Ainda estava
extremamente ferido dos últimos golpes e do sopro. Arctus não tinha tantas
curas em mãos.
-Nem parece o druida que conheci naquela vez contra Cícero –
criticava o mago.
-É fácil falar. Você ainda deve estar cheio de magias e mana.
Já meus encantos estão quase acabando.
-Eu sei sobre uma magia druídica que talvez servisse nesse
caso.
-Sério?
-Sim. É uma que mexe com pedra com pedras e rochas.
-Espere... Eu conheço essa! E tenho gnose suficiente para
isso!
-Então a lance!
No mesmo momento, Seton prendeu a foice com um golpe no chão.
Com as mãos livres apontou para Daehim. Este, o desafiou com escárnio:
-O que vai fazer homenzinho? Rezar ao seu deus? Contra mim?
Seton serrou os dentes para gritar com toda força de seus
pulmões.
-Não contra você! Contra a parede! Ceridween, mam ddaear fawr, symud y
anadweithiol!
As pedras que estavam atrás de Sombra Gélida caíram sobre seu
corpo. Seu corpo estava cheio de feridas e o sangue vermelho dele, tinham um
dor bem mais negro do que qualquer outro ser que tenham visto. Ele ainda estava
vivo, mas, além disso, os aventureiros notavam sua intenção de fugir do
combate.
Tanto Gustavo como Thror estavam prontos para atacar o tal
Marduk, mas ele foi mais rápido: de sua boca soltou um bafo de chamas negras
parecidas com as de Daehim. Havia coberto o espaço onde estavam os dois
guerreiros com aquele fogo profano.
Quando a fumaça cessou, foi possível ver que eles estavam
bem, mas seus escudos pareciam que iriam partir ao meio com um novo golpe. E
então, com passos firmes, os dois correram em investida na direção do inimigo.
Seus corações estavam cheios de chama da glória heróica. Em um movimento, os
dois partiram suas proteções no rosto do Marduk, antes que esse pudesse reagir.
Isso só o fez ficar inconsciente.
Notando a desvantagem no campo de batalha, - não pelo numero,
mas pela força em combate – Daehim começou a recuar. Ele ficou em duas patas.
-Ele vai fugir! – gritou Halphy sacando a Vampira de Almas.
Só foi possível ouvir o som de asas sacudindo a terra sobre
elas. Logo em seguida, a criatura saltou no ar, como se encontrasse um único
ponto de fuga. E isso era verdade.
Mas Arctus não cederia tão facilmente. Ergueu Fim-dos-Dragões
enquanto saltava contra o temível monstro. A lâmina brilhava de intensidade,
assim como o corpo do padre. A luz se intensificou com as forças que habitavam
na caverna. Parecia um anjo saindo do Inferno.
O dragão passou pela passagem gigante de luz sem ser atingido
pela lâmina sagrada. Nesse mesmo instante Arctus, que caiu do outro lado,
praguejava. Halphy chegou até ele.
-Empreste-me a Fim-dos-Dragões – disse ela.
-Mas o inimigo já fugiu – respondeu o padre.
-Faça o que falo!
Tão rápido quanto ela exigiu que fizesse o que mandou, ele
entregou a espada. Seu brilho diminuirá isso era bem visível.
-O que vai fazer? – gritou Lacktum.
-Olhem e descobrirão – falou ela em resposta enigmática.
Enquanto ela segurava a Vampira de Almas na mão esquerda, na
direita, estava Fim-dos-Dragões. Ambas emanavam uma relativa aura de poder.
Porém, não foi nada disso que espantou os membros dos Dragões da Justiça, e sim,
o fato de um par de asas surgirem nas costas da meio elfa. Eram coriáceas e
lembravam as de um dragão, quase de tom avermelhado. Elas começavam a bater
como se fosse alçar vôo. Foi exatamente o que ela fez.
Suas asas batiam como se fosse uma forte ventania que cobria
o campo de batalha, após uma sangrenta guerra. Parecia que ela trazia paz para
muitos ali. Todos se espantaram com a cena.
Mas não era isso que afligia os jovens Dragões.
Lacktum pediu que amarrassem o marduk, e quando ele
despertasse, responderia questões sobre isso.
Os animais saiam de seu esconderijo. Fiel pousou sobre o
ombro de Seton, enquanto este curava o pulso ferido de Thror. Valente
tentava arrastar o medroso Furta Trufas,
que tremia desde que viu a transformação de Daehim. Só Alexander se mantinha
calmo andando até o líder dos Dragões.
Arctus e Seton, como de costume, ficavam tratando e curando as
feridas no corpo dos membros daquele grupo. As piores eram em Lacktum, mas ele
exigiu que cuidassem de Thror e Gustavo primeiro. Não sobreviveriam sem força
bruta, já que as magias de todos estavam quase acabando. Eles eram mais que
necessários.
Enquanto o mago ruivo olhava para aquele lugar por onde
passaram o dragão e a hibrida de elfa e homem, Alexander chegou até ele.
Lacktum se abaixou com dificuldade devido aos ferimentos no corpo. O arcano fez
carinho no cão como se isso aliviasse a dor no coração dele.
-Então Van Kristen, - falou o cão – o que lhe deixa tão
triste? Não venceu a batalha? Não deveria estar alegre?
Ele fitou os olhos do cão. Parecia com os olhos de um amigo
que se preocupa. E eram.
-Notou as asas que brotaram de Halphy?
-Sim, mas o que...
-Eu como mago, entendo da Arte e sei que aquilo que ela usou
não foi um encanto. Era muito poderosa para ser feita sem componentes verbais
ou gestuais. Era um item mágico. E ela não me contou nada.
Marduk despertou completamente cercado. Muitos membros do
grupo se sentiram irritados com o fato de terem perdido suas proteções. Em
especial Thror, que era apegado demais às coisas materiais. Mesmo assim, seu
rosto esboçava raiva e malícia próprias dos corações malignos. Nem parecia que
estava em situação desfavorável.
Os jovens e os animais estavam parados, olhando com fúria. Todos
estavam ali, com exceção de Halphy, mas Lacktum acreditava que ela estava em
segurança. Ele diz que sentia isso.
Independente de tudo isso, Gustavo começou golpear o rosto do
hibrido. Ele parecia irritado. Nem parecia o mesmo paladino de antes. Irado
poderia ser o mais correto. Foi detido pro Thror. Ele não queria obter
informações, ele queria satisfazer sua raiva.
-Ei Salles, calma – pedia o grego ao colega.
-Me pedoe. Não sei o que se apossou de mim.
-Você não é assim paladino. O que houve?
-Talvez, - começou a falar o marduk – ele tema a maldição de
Diogo Fernandez.
Alguns olharam com estranheza para Marduk. Outros temeram o
peso de suas palavras.
-Como sabe o que Diogo rogou contra mim?
-Diogo rogou algo contra você? Como? – alguns perguntavam
quase que em coro, constrangendo o paladno.
Gustavo então notou que seu segredo fora exposto aos outros
membros do grupo, com exceção de Arctus, que já a conhecia.
-Só irá morrer pelas mãos de quem mais ama – disse o híbrido
de dragão e humano – Não foi isso que ele disse? O mestre irá a trazer a tona o
segredo de todos. Incluindo o Seton. Lembra do seu passado, todo sem luxos e
sem agrados? Mestre Kalic Benton nos falou informações sigilosas sobre cada um
de vocês. Todos! A maldição de Gustavo, a pobreza de Seton, a sede por poder de
Halphy, a vontade d vingança que Lacktum nutre, até mesmo a falta do passado de
Thror... Tudo isso, o mestre de meu pai conhece e sabe. E muito mais. Creiam.
-Seu pai? Refere-se ao dragão que enfrentamos? – disse um
sábio mago ruivo. Como sempre a curiosidade de Lacktum falava mais alto.
-Sim! Daehim, a Sombra Gélida, the King of the Darkness in
Ice, o Gaurhoth, mestre dos dragões que servem ao Pacto de Guerra. Ele é uma
das últimas proles na face de Gaya antes do êxodo dos dragões, na Era Mítica.
Ele criou a mim e muitos outros.
-Sabe muito para um hibrido. O dragão então veio do norte,
pelo menos é o que parece nos nomes. E os nomes de seus filhos são baseados em
deuses. Pois deve se achar superior a eles – disse Gustavo sabiamente.
-Ele nunca será superior a Ares em combate – se orgulhou
Thror.
-Ou seque vencerá Cernunnos e Ceridween – falou Seton
apoiando o guerreiro.
O guerreiro com forma dracônica começou a rir com força
tamanha que quase se afogou. Alguns temeram que ele lançasse o sopro sombrio.
-Do que esta rindo, bafo de enxofre? – perguntou Valente do
lado de Lacktum.
-Ora pequenino, me regozijo de dois fatos... Primeiro, por
simplesmente quererem saber mais sobre o inimigo que esta mais próximo do que
do verdadeiro oponente. Ele que surgiu em um período que entidades caminhavam
entre nós. Vocês dificilmente compreenderão quando mais vencerão.
-Quer dizer que os seus mestres sabem que mal estão para despertar?
Eles já deveriam saber, mas falaram o suficiente para nos deixar temerosos –
questionou consigo mesmo o padre.
-Sim – sarcasticamente falou Marduk.
-E qual o segundo motivo de seus risos? – perguntou ajoelhado
o mago inglês, enquanto fitava o marduk – Vocês sabem disso tudo sobre nós, mas
se eles quisessem nos afetar de verdade bastaria disseminar o que sabem sobre
nós quando nos encontraram. Isso pode ter haver com alguma coisa em relação com
chegarmos intactos até aqui e do dragão dourado lá atrás não é?
Todos olharam com estranheza para o mago. O meio dragão
esboçou um sorriso.
-Como soube? – disse espantando e satisfeito o inimigo
tombado.
-Deixaram o corpo de Lirah e Federick aqui. Mas isso só afeta
a mim e Gustavo. Apesar de muitos conhecerem minha história no grupo ou ter
combatido com o Salles que morreu. Mesmo com tudo que isso significa para nós,
duvido que queiram só afetar dois desse grupo. Até agora confrontamos inimigos
plantados pelo mestre deles Kalic Benton II. O dragão dourado não se encaixa em
nenhum dos históricos do grupo. Ainda não sei o interesse desse mago mascarado
em mim, ou como ele pretende atingir o paladino, mas esse filhote não parece
fazer parte desse esquema. Algo esta errado aqui. Como se quisessem nos
encurralar. Isso fica mais visível quando nos lembramos que eles não queiram
nos matar. É o que...
-Nós fomos os únicos com real autorização de matar vocês –
interrompeu Marduk.
-Como? – perguntou o paladino, voltando sua fúria contra o
inimigo, que novamente foi aplacada pela força do guerreiro Tzorv que segurou
ele – Do que fala abominação?
-O que quero falar é que todos os encontros em combate, mas
terras inglesas, e até mais além, foram falsos. Todos tinham ordens expressas
de não os atacar de forma fatal.
O mago que sempre falava tanto, de repente se calou. Talvez
fosse algo que El já havia imaginado, mas se negou a acreditar. O inimigo
estava um passo a frente deles, os Dragões da Justiça e brincava com eles.
-É isso não é tudo – continuou o falante marduk – Por que estou
falando tudo isso, é o que estão se perguntado. Nossas ordens eram, que caso
sobrevivêssemos teríamos que falar a vocês os motivos para ter deixado o dragão
aqui.
-Não faz sentido! – ressaltou o jovem arcano.
-Lacktum – aproveitou para comentar o cão – a ladina esta
longe faz um bom tempo. Seria melhor a seguir para ver se ela esta bem.
Era claro que o mago havia se concentrado demais no
interrogatório de Marduk.
-Fiel e Rec, subam e vejam se Halphy esta bem.
Rec surgiu dos mantos de Lacktum. As duas aves subiram tão
rápido quando Van Kristen pediu.
O resto do grupo olhava com raiva para Marduk. Ele quase
matou Gustavo e Thror. E realmente ninguém gostou das atitudes dele até agora.
Tinham motivo para isso.
-Bem vamos ao que interessa... Qual o motivo de colocar esse
filhote de dragão ao nosso alcance? – definiu o paladino – O que o mago falou
tem sentido. Qual a relação do dragão nisso tudo.
Eis que do alto surgem três pares de asas. Dois deles eram
das aves, o outro era de Halphy. Ela pousou graciosamente, mesmo com seu
aspecto tenebroso devido ao contraste com a pele humana e o item arcano.
-Acho que já sei – enquanto falava isso, Halphy se aproximava
com a Vampira de Almas na cintura. Enquanto isso, ela brandia Fim-dos-Dragões
em sua mão hábil.
-Sabe? – duvidou Lacktum.
-Sim. O motivo é que eles querem a morte do dragão dourado.
Precisamos matar o filhote.
-Como assim? – falou Gustavo.
-Esta louca mulher? – exclamou Seton.
-Do que esta falando Brown? – perguntou Lacktum.
-Não consegui matar o dragão das sombras, mas ele disse que
os planos deles de dominarem mais dragões estavam quase completos.
-Eu ainda não entendo – confessou um Gustavo ainda confuso.
Halphy se aproximou lentamente do centro da confusão, notou o
combatente com corpo parecido com um dragão. Era enorme para os padrões humanos
e até mesmo dos elfos de Avalon.
-Bem – continuou a meio elfa – o dragão possui um símbolo.
Agora que me recordei ele pode ser ativado com a finalidade de controlar um ser
poderoso. Pelo menos é o que eu me lembro.
-E como arrancamos isso dele – falava Thror com seu modo
bruto.
-Não arrancamos. Ou matamos a fera ou ela será usada nos
planos de nosso sinistro inimigo.
Houve silêncio na caverna por alguns instantes. Cada novo
passo teria que ser friamente calculado.
Halphy se aproximou calmamente de Marduk. Notando seus
movimentos furtivos, Arctus interrompeu o trajeto da moça.
-O que esta fazend? Saia daminha frente padre!
-Não sem antes você me entregar essa espada!
-Ela não é sua. Foi concedida por Vardemis, mas sabe que não
é digno dela. São duas coisas completamente diferentes.
-Não vou discutir sobre isso. Por acaso pretende matar esse
marduk?
-Sim. Por acaso pretende me deter?
-Lógico! Podemos obter mais dados dele.
-Ah lógico! Como fizemos com o tal Rufgar. Quem sabe o
libertar... N’ceste pa? Para que faça o mesmo que aquele anão e voltar correndo
para o líder? Cada erro, cada fraqueza de nosso grupo é contada ao inimigo.
-O que queria? Que nós simplesmente o matássemos?
-Esse é o movimento mais correto.
-Quer matar ele, quer matar o dragão... Vai querer mais
alguém morto? – falou nervoso Lacktum.
-Quem mais for necessário – respondeu a jovem com um tom
irritado.
-Não reconheço você com essas palavras. Esta ouvindo o que
diz?
-Você deveria estar ouvindo o que diz. Nem parece que nota a
quantidade de problemas que possuímos. Estamos indo até o Portal de Ixxanon,
mas sabemos que o caminho esta cercado por homens do Pacto. Além de toda a
sorte de criaturas malignas. Só que eles não querem nos matar. Eles acham engraçado
nos encurralar, brincar com noção de perigo e nossos recursos cada vez mais em
combate. Tratam-nos como um gato que se diverte com o rato antes de devorá-lo.
Eles nos deixaram viver! Querem que saibamos disso! Precisamos reagir na media
em que sobem em suas atitudes contra nós!
-Pare com isso Halphy!
-E estou farto de você ruivo! – isso era falado, enquanto ela
colocava o dedo indicador no peito do mago, como se quisesse o provocar – Nem
parece o rapaz que conheci há alguns meses! Cheio de fúria e chama! Mas pelo
menos tinha atitude! Só que não, você como líder tem que ser justo com os
inimigos, do modo que eles não são conosco. Acho que esse padre enfiou idéias
na sua cabeça.
Arctus começou então a falar:
-Jesus proteja essa alma.
-Ah cale a boca! Você e esse seu Deus Cristo não servem de
nada! No seu caso você deve seguir esse deus para obter poder dentro do clero!
Halphy estava nervosa. E quando algo assim acontece com ela
se segura, o quanto consegue.
O padre não deixaria isso sem a devida resposta. Era comum
ele se irritar, mas sempre aprendeu a reprimir a raiva das ofensas contra si.
Sendo que a ira é um dos pecados mais comuns entre os homens fracos. O problema
era quando isso se referia a sua fé.
-Sei que deve adorar outros deuses Halphy. Porém, isso não
lhe concede o direito de rebaixar a fé de qualquer outro. É um momento difícil
para todos.
-Ah vá para o Inferno!
Quando a fealith falou isso, ela pegou espada que matava
dragões e graças a velocidade que o item que lhe concedia asas, voam em direção
ao pescoço do marduk. Foi inesperado e mesmo com Gustavo tentando a deter, não
obtiveram sucesso. Isso era claro já que Marduk estava caído no chão.
-Aprendam com isso! – ela exigiu para o grupo. A lâmina
Fim-dos-Dragões pingava sangue com a força de um vento sombrio que soprava nos
cabelos com tom marrom.
-Esta louca mulher! – falou um Seton irritado.
-Pensa que isso é certo?
- criticou e perguntou e Gustavo.
Ela levantou o rosto e brandiu a lâmina na direção dos
companheiros. De repente, soltou do rosto branco manchado com o sangue do
morto, um claro e sincero sorriso de satisfação. Naquele momento, foi quando
estiveram mais próximos de acreditar que a jovem estava tomada por um espírito
maligno que a enlouqueceu. Ela prosseguiu.
-Padres sempre serão taxados por ter o sangue dos elfos e
homens, nós meio elfos. Mesmo sendo de uma segunda geração de falsas fadas,
como alguns falam. Os homens conhecidos como sacerdotes uma vez me encontraram
e me torturaram, querendo expulsar o demônio de mim. Como se eu estivesse
possuída... Minha mãe fez eles se arrependerem amargamente. Não interessa muito
isso agora. Mas o pior foi uma jovem garota ao qual convivi que morreu
apedrejada por aldeões. Ela era tratada por todos como uma aberração élfica por
possuir uma pequena protuberância em sua orelha no começo. Eu e minha mãe
cuidávamos dela, pois era órfã e por uma sorte na sua vida, ela encontrou nossa
cabana na floresta – nesse momento ela abaixou a cabeça, como se soubesse que
lembranças amargas voltariam ao seu espírito – Era como uma irmã para mim.
Enquanto aprendia a arte das ervas, ela aprendia a feitiçaria que minha mão me
negou. Não importava com isso. Nós nunca nos odiamos, pois sempre fomos párias
aos meros humanos.
-Halphy – soltou um preocupado paladino – como tem certeza
que não era uma fea... Meio elfa?
-Minha mãe é uma poderosa feiticeira. Ela sabia. De qualquer
jeito, me lembro que minha mãe nos chamava de Aves do Crepúsculo, pois nossas
vozes – e nesse momento, mesmo tentando segurar o choro, ela derramava as
lágrimas – eram lindas quando o sol se escondia. Certa noite, ela fugiu até uma
aldeia e ela foi morta por pedras, paus e toda a sorte de coisas pesada. Entende?
O mesmo povo que venera esse seu Deus Cristo. Aqueles que seguem o tal Jesus de
Nazaré. Palavras são somente palavras, se não acreditar nelas de verdade. Eles
nunca acreditaram, e nunca acreditarão de verdade e seus ideais tão nobres. Eu
me lembro deles e do seu modo de agir com quem achavam estranhos. Como nos
enfrentavam, e diziam que éramos demônios. Só por sermos diferentes.
O jovem e bondoso Gustavo abraçou a emocionada Halphy. Ela
derramava muitas lágrimas. Todos abaixaram a cabeça notando do que se tratava.
A jovem estava preocupada com todos.
Lacktum tremia, pois começou a notar que a jovem tinha razão
em suas palavras. Era mais que necessário fazer coisas que iriam contra a
índole bondosa do grupo. E era ele, como líder, quem deveria agir e sofrer as
conseqüências dos seus atos.
-Vamos procurar os aldeões. Depois – e falou isso enquanto
sacava a adaga que recebeu de seu pai – eu mesmo terei que matar o dragão.
Os Dragões da Justiça voltaram até o quarto onde estava o
filhote dracônico. Assim mesmo, todos temiam o que estavam para fazer. Tirar a
vida de uma jovem criatura, que nem imaginava a motivo pelo qual morreria.
Seton ficou encarregado de levar os aldeões para fora de
forma segura. Eles usaram a passagem que havia no lugar onde encontraram
Daehim. Ao que parece, o lugar era a passagem alternativa que havia sido
comentado com eles antes.
Enquanto andavam, Alexander e Lacktum conversavam.
-O pior é isso: viemos até aqui para eliminar Daehim, e no
final, teremosque matar um ser inocente – falou o cão em tom triste.
-É nossa única alternativa. Se o deixarmos vivo o que poderá
ocorrer em seguida será nossa culpa. Muitas pessoas contam conosco. Como queria
ter que caçar artefatos amaldiçoados ao invés de fazer isso.
-Você acha que Halphy estava certa no que falou?
-Ela pode ser dura, quase sempre esta certa em seus
pensamentos.
-Então... Devo comentar algo que poderia deixar nossa viagem
pior.
O jovem e perspicaz mago inglês olhou para trás com a
finalidade de notar se alguém escutava sua conversa.
-O que você quer dizer com isso?
-O único que não foi citado por Marduk foi o clérigo Arctus.
Quando ele falava sobre o passado de todos.
-Mas ele também não citou o passado de Thror.
-Até onde se sabe o grego não tem passado conhecido por
ninguém. Não é isso?
O mago começou a pensar sobre o assunto. Isso envolve muitas
coisas escusas, inclusive as suspeitas de todo o grupo. Será que Arctus trairia
o grupo como muitos estavam supondo? E seria ele o traidor?
No grande salão iluminado, os aventureiros esperavam. O
filhote continuava no mesmo lugar em cima da marca que o prendia naquele lugar.
O estandarte permanecia lá, como um símbolo sinistro. E era um sinistro destino
que o esperava.
Lacktum havia chegado a poucos instantes e segurava a adaga
que recebeu do pai. Lembrou-se que uma arma só servia para isso: matar. Não
possuía mais nenhuma função benigna. O que trazia ao jovem más recordações.
Lembrava de seu pai, que o forçava a treinar com armas. Ele
nunca gostou e quando ocorreu de tornar mago sentiu-se até que aliviado.
Logicamente, ele havia perdido todos que amou, mas nunca portaria uma arma com
a função de matar. Só com a de se proteger.
Mas naquele lugar abaixo do estandarte macabro, havia um
dragão que iria morrer pelas mãos dele.
Ele aproximou do filhote com a adaga presa na cintura.
Normalmente ele a guardava na vestimenta, mas dessa vez não o fez. Começou com
carinhos na grande criatura que parecia uma criança. A sensação na mão do jovem
inglês era de paz. Era como sentir o coração pulsando de seu filho
recém-nascido, pensou o arcano, sem nunca ter um filho. Aquele ser era mágico,
em todos os sentidos das palavras. Agora entendia o porquê de alguns místicos
disserem que a Arte estava nas pequenas coisas da vida. Pois são elas que fazem
o todo que torna tudo maior. Como uma abelha que compõe uma colméia, como um
anjo junto a uma falange, como uma estrela no céu noturno, como um rio que
deságua no mar. Todos esses pensamentos lhe vieram com um simples toque na tez
do filhote. Era um pecado o que ele iria cometer.
-Me diga filhote, qual é o seu nome? – perguntou o jovem
arcano.
-Eu não possuo nome. Eles só me chamavam de experiência.
A jovem Halphy começou a chorar. Parecia extremamente
arrependida de ter entregado a informação ao qual seria necessário matar o
dragão. Mas voltar atrás nas palavras não era seu modo de agir. Era uma mulher,
jovem e meio elfa, e sempre precisava demonstrar força perante aqueles que
duvidavam dela. Só que as vezes esses sacrifícios pareciam pesados demais para
si.
-Bem então vou te chamar de Draclyn, que significa promessa
dracônica... Você – e enquanto falava isso, tremia o corpo de medo, se
arrependesse de algo que ainda ao tinha feito – gostaria de escutar uma música
em minha língua natal?
-Sim, como se chama? – perguntou o recém-nomeado Draclyn.
Lacktum diria mais tarde a seus amigos que ele sentia como se o dragão soubesse
que nunca mais veria a luz do sol. Algo no tom de voz daquele ser, o fazia
acreditar nisso. Era a sabedoria antiga dos dragões agindo naquele ser.
-Se chama Canção do
Farol dos Perdidos. Gostou do nome?
-Parece triste – disse isso com um tom mais triste, mas logo
falou em tom festivo quase – mas sincero. Cante para mim.
Feito isso, o mago beijou a face da criatura, enquanto essa
abaixava o pescoço como em sacrifício. Ele sabia o que estava para acontecer.
-As músicas de meu povo são lindas por conta de nosso idioma.
E espero que esta dure gerações. Bem Draclyn, posso me enganar com as letras,
mas acredito que seja assim...
Quando a noite chega
E ninguém lhe escuta.
Quando chega a lua
E então você pode chorar.
Há uma luz nesse túnel
Dos desesperados.
Há um cais ou um porto
Para quem precisa repousar.
Estamos todos no Farol dos Perdidos
Para quem precisa de abrigo.
E enquanto a canção era recitada, o dragão fechava os olhos
com a cabeça no chão. A adaga brilhou, enquanto era envergada no alto. Muitos
viraram seus rostos e nenhum olhou para a cena, com exceção do próprio
assassino. Pois era assim que o mago se trataria por dias, meses e até anos,
mesmo que tudo terminasse bem. Mesmo assim, o único que não chorou foi o
próprio Lacktum. Ele sabia que não deveria se deixar entregar pela pena ou se
não perderia a vontade. E foi com essa determinação que a adaga desceu. E por
isso os olhos de Draclyn nunca mais brilharam naquela era.
Os homens e mulheres do Vale das Esmeraldas já haviam deixado
a caverna pelas escadas que ficavam na última câmara onde encontraram o dragão
maligno. Nesse tempo, encontraram um lagar que estava abandonado há muito
tempo.
Quando saíram de lá, muitos dos Dragões choravam ainda. Todos
que viam seus olhos cheios de lágrimas, perguntavam o motivo disso. Recebiam a
mesma resposta:
-Perdemos alguém lá embaixo.
O que era estranho, já que mesmo com as feridas tremendas em
seus corpos, não pareciam ter perdido ninguém em combate. Nenhum de seus
membros estava morto ou incapacitado. Talvez fosse só um jeito de se expressar.
Antes fosse. E eles caminhavam com força em seus pés, enxugando seus rostos.
Todos com exceção de Lacktum.
-Ruivo - disse Halphy quando conseguiu melhorar – você chamou
o filhote de Draclyn. Por acaso fez uma promessa usando esse nome? E se for que
promessa é essa?
E então, a ladina feiticeira notou que o mago parecia mais
ainda com o jovem que conheceu em Starten. Parecia ter saído daquela igreja
novamente, com toda aquela raiva, capaz de destruir tudo e todos.
-Eu prometi que farei o que for preciso para matar ou
destruir o culpado por isso tudo. E não derramarei uma lágrima sequer até
descobrir quem é ele pelo menos! Isso não é uma ameaça ou promessa somente, é
uma maldição! Isso eu falo por Odin como testemunha.
Pobre Lacktum. Mal sabia que às vezes os deuses
nos ouvem. Mal sabia que maldições se voltam contra nós. E que desejos quando
são realizados nem sempre são bons. Pois enfim, ele saberia de boa parte
verdade de seu passado.
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